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Por que elas correm da política

Esta semana fui a uma movimentada estação de metrô em São Paulo para abordar pessoas que passavam, convidando-as a participar de uma breve entrevista filmada.

O fluxo de gente era grande, então rapidamente conseguimos chegar ao nosso objetivo de entrevistados. Mas percebemos que das cerca de 30 pessoas que abordamos, nenhuma mulher havia topado participar. Elas até se aproximavam, curiosas, quando viam um cameraman e uma repórter, segurando um microfone. Mas quando percebiam que a conversa tratava de política, saíam correndo como se tivessem visto um fantasma. Alguns dos pretextos para a fuga desesperada eram “Ah não gosto disso não”, “Não entendo nada disso” ou “Não sei falar disso”.

Não sei se por medo, asco ou puro desinteresse, parece que o assunto quando envolve temas políticos afugenta a maioria das mulheres. Afastava alguns homens também, mas em bem menor proporção. Normalmente eles encaravam as perguntas numa boa, colocavam suas opiniões (alguns de forma bem entusiasmada) e saiam aparentemente satisfeitos.

Sim, temos menos de 15% de representatividade feminina no Congresso Nacional, num país onde as mulheres são a maioria da população. E com base nesses números, nossos nobres parlamentares se veem na obrigação de fazer malabarismos legais para tentar acabar com essa “distorção”. Evidentemente que aí sim criam verdadeiras distorções.

Primeiro, estabeleceram que 1/3 dos candidatos de cada partido teriam que ser obrigatoriamente do sexo feminino. Aí a conversa nos bastidores dos partidos flui mais ou menos assim:

– Temos aqui 60 candidatos homens e apenas 10 candidatas mulheres. O que faremos?
– Não pode, vamos ter que cortar 30 homens.
– Mas são qualificados, senhor. Dariam ótimos candidatos.
– Então arruma mais 10 mulheres, pombas! Pode começar por aquela sua tia Maristela. Vê se ela não quer uma batedeira nova em troca de ser uma candidata no nosso partido. E depois liga pra suas primas…

O nome “técnico” disso é candidata laranja. Estudos apontam que na ultima eleição tivemos mais de 5.000 delas, sendo que nem elas mesmas se agraciaram com o próprio voto.

O último malabarismo legal para atrair pessoas do sexo feminino foi a brilhante ideia de dobrar o peso do fundão eleitoral para candidatas mulheres. Sim, aquele fundão imoral que agora está em R$ 4,9 bilhões, e que nos obriga a bancar showmício do Renan Calheiros e advogados para livrar Loola e sua gangue da cadeia. Então, os caciques partidários agora precisam de mais mulheres (provavelmente laranjas) para encher os bolsos das campanhas de seus partidos. Agora vai, Brasil.

O que eu sugiro é que esses parlamentares circulem pelas estações de metrô de São Paulo e de outras cidades do Brasil. Provavelmente notarão que não são as cotas ou fundões que farão as mulheres se interessarem pela política. Antes de mais nada, elas precisam ter a curiosidade, a vontade de aprender e finalmente o desejo de participar.

Mais uma vez, constatamos que quando os políticos decidem corrigir aquilo que julgam ser um problema, quase sempre acabam piorando as coisas.

A mulher pode muito, pode o que quiser, quando quiser. Na política não é diferente. Mas precisa perder o medo ou asco, nem que seja para fazer bom uso do seu voto e de sua voz.

Bora, mulherada!

Tatiana Poroger

Tatiana Poroger

Paulistana, graduada em administração de empresas pela Pace University NY, trabalhou no mercado financeiro, em gestão de educação e na área comercial, até se descobrir no marketing digital, onde atua até hoje. É também ativista política, colaboradora do Ranking dos Políticos, além de curiosa e palpiteira.

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Um Comentário

  1. Então surge uma pergunta. Por que a mulher tem “medo” ou “asco” de política? Sinceramente, eu não sei, mas vou dar um chute. Não seria uma certa timidez fundamentada na ideia de que política não é coisa de mulher? Não seria medo de conflito num cenário político polarizado? Desculpa, mas eu acho que uma única experiência no metrô é muito pouco para sair por aí tirando conclusões.

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