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Sobre Pep Guardiola, “Lacrolândia” e a Era da Hipocrisia do bem

A Lacrolândia foi à loucura essa semana quando o célebre treinador Pep Guardiola, disse em evento da XP em que foi entrevistado, que se interessava em “ganhar dinheiro com seu trabalho e não ganhar dinheiro dormindo”, ao ser perguntado sobre investimentos. Não faltaram “vivas” à declaração do treinador do Manchester City, como se investir fosse algo do capeta.

Desde que o mundo é mundo, a forma é tão importante quanto o conteúdo, o que implica que as pessoas precisam não somente se preocupar com a sua causa, mas também com a maneira de expressá-la, para não entrar no clube daqueles que estão errados, mesmo quando estão certos. Pois bem, de uns anos para cá, com a massificação das redes sociais e o fim da privacidade, há um tendência em se valorizar somente a forma, o conteúdo fica em segundo plano. Já não importa o que você faz, só o que você fala. Vivemos na era da hipocrisia do bem e a essa altura você já deve estar visualizando vários exemplos conhecidos.

Voltemos ao Guardiola. Ele recebe €22 Milhões ou uns R$ 150 Milhões de reais por ano, só de salário. Vamos concordar que para viver nababescamente ele precise de…uns R$ 5 milhões (olhe que eu chutei bem alto, para não dar margem à dúvidas), sobrariam R$ 145 milhões. Vamos tirar imposto e outras avenças, digamos que sobrem R$ 100 milhões (estou fazendo as contas em Reais para termos uma visão mais próxima da nossa realidade). Então, se ele doar tudo que sobrou, deixar parado na conta ou investir em uma caderneta de poupança, que lhe renda juros minguados, eu daria algum crédito à sua declaração, mesmo a considerando infeliz.

Convenhamos que dificilmente essa é a realidade. Guardiola deve ter um ou varios “private bankers” que gerenciam essa fortuna toda e tratam de ampliá-la e quase certamente, como consequência direta, seus investimentos geram emprego e renda a terceiros. Para os que pregarem que ele pode ser um filantropo, eu contesto tranquilamente que doar 5, 10 milhões, quando se sobra 100, é fácil, sem desmecer quem o faça ( desconheço a vida pessoal do Guardiola, nem sei se é um filantropo).

O que nos leva à conclusão de que o treinador do Citi é um mentiroso, ou na melhor das hipóteses, um hipócrita do bem. Seu discurso está alinhado ao “mimizento” besteirol do politicamente correto, que atribui os males do mundo ao capitalismo, como se ganhar dinheiro fosse um pecado. Talvez Guardiola sinta alguma culpa por receber esse salário todo e ser um dos homens mais ricos do planeta e eu tendo a concordar que o trabalho dele não vale tanto, mas quem sou eu nessa arena capitalista, não é mesmo?

A verdade é que gente comum busca sim entender quais são os melhores investimentos a serem feitos com o suado dinheiro que sobra, quando sobra, do orçamento. Nada comparável ao Guardiola, cujo salário anual não seria atingido por reles mortais nem em muitas e muitas encarnações somadas.

Mas o criticável aqui não é o salário dele, afinal, se o seu empregador acha que vale tanto, então é porque vale. A maior crítica aqui, na minha opinião, é o sujeito querer passar pelo que não é. Entoar o canto da massa porque soa “bacaninha”.

Um valor que prezo muito é a coerência. E nos tempos de hoje, essa é uma virtude muito pouco considerada. Melhor é parecer bonzinho. Nem que você pregue o amor e nos bastidores seja um truculento costumaz, vale o que você fala. Estamos cansados de assistir a essas contradições ambulantes por aí  (particularmente intensas durante essa pandemia).

É dose ter que ouvir de um sujeito que faz pelo menos R$ 150 milhões por ano que não liga para investimento e ainda aturar os que o aplaudem, mas que tampouco são usuários de dinheito embaixo do colchão.

A Era da hipocrisia do bem é extremamente cansativa.

Victor Loyola

Victor Loyola, engenheiro eletrônico que faz carreira no mercado financeiro, e que desde 2012 alimenta seu blog com textos sobre os mais diversos assuntos, agora incluído sob a plataforma do Boteco, cuja missão é disseminar boa leitura, tanto como informação, quanto opinião.

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4 Comentários

  1. Pois é Victor, a hipocrisia está no ar. As pessoas comuns e que precisam de seus empregos para sobreviver estão com medo de manifestar-se verdadeiramente, pois ao chocar a turma do “mimimi” podem se dar mal.

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