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Cinquenta

No início do segundo tempo da vida...!

Há pouco mais de 10 anos, quando cheguei aos 40, escrevi um artigo para brindar a esse momento (Quarenta). Era para eu ter atualizado a versão do texto uma década depois, mas acabei deixando passar. Então, antes que eu me converta em uma boa ideia (51), resolvi arriscar uns pitacos sobre o significado de um cinquentenário.

Primeiramente, o impacto de chegar aos 50 é bem maior que aos 40. Nós conhecemos muita gente com mais de 80 anos (o dobro de 40), mas pouquíssimas pessoas centenárias (o dobro de 50). Ao rompermos essa fronteira, temos praticamente certeza de que já estamos no segundo tempo da vida.

Aos 40 o ecossistema de “perrengues” ainda é incompleto, 10 anos depois ele estará bem mais robusto. Se a biografia de uma vida fosse publicada aos 30, teria o conteúdo de um gibi. Aos 40, de uma revista semanal. Aos 50, daria um livro de verdade.

Não posso emitir testemunho de quem chega aos 50 sem filhos, mas quem os tem sabe, a última década foi ocupada por eles. Independentemente da idade, esse período será intenso com a filharada. Nessa fase, quase todos os cinquentenários experimentamos o papel de atores no movimentado filme que retrata a passagem da infância para adolescência, exercendo importante papel de coadjuvante em qualquer roteiro que se construa. Com alguma frequência, experimenta-se na vida dos cinquentões a realidade de já ter filhos fora de casa, mesmo que ainda dependentes financeiramente, em um ensaio do que será a ruptura do cordão umbilical mais adiante. Podemos nomear essa quinta década como a era dos filhos, para quem tem o privilégio de ser pai ou mãe.

Até em decorrência das razões acima, quem chega aos 50 pode ser reconhecido com o título de doutorado em pagamento de boletos. Eles aparecem por toda parte, brotam da terra e caem do céu. Não raro você tem a sensação de que vive para pagá-los! Também poderia ser a era das contas a pagar.

São as dores dos 50. Falando nelas, difícil viver sem uma que lhe acompanhe, uma lombarzinha aqui, um joelho acolá, e por aí vai. Quem não se exercita nessa fase da vida, se complica. E para quem tem a sorte de não tê-las e em seu convívio, un ‘check up’ de rotina certamente identificará alguma coisa que não está funcionando como deveria. Nessa idade, é difícil imaginar sua rotina sem algum remédio. Eu os evitei por 49 anos, mas o colesterol acima do limítrofe não deixou margem para começar o segundo tempo sem minha dose diária de Tresor (10mg).

Mas nem tudo são dores, o meio século de existência nos oferece benéficios que somente o tempo é capaz de prover. É o que chamam de experiência, algo que você não compra, mas acumula por vivência. É o somatório de histórias experimentadas por você ou pessoas próximas que aumentam substancialmente sua capacidade de prever que “algo vai dar ruim (ou bom)”. Todos a tem de sobra aos 50, mas muitos a ignoram e outros não a utilizam. O valor da experiência se multiplica se usada ou compartilhada.

Com cinco décadas em que expectativas foram frustradas, rotas alteradas, planos revisados e sonhos adaptados, já é possível discernir quais batalhas valem a pena e isso é uma dádiva, torna a vida menos cansativa, a famosa arte do “essa eu vou deixar para lá”.

O tempo já não é tão abundante como antes (lembre-se que se dobrarmos nossa idade, provavelmente já não estaremos nesse plano) e por causa disso a priorização de como ele será gasto é algo relevante, quem acumulou cinco décadas não quer investi-lo em programas que não valem muito a pena.

Também aos cinquenta já vivenciamos a “partida” de pessoas próximas. Se aos 40 havia um chance, mesmo que mínima, de que isso não tivesse acontecido, dez anos depois a perda faz parte do cenário da vida, algumas vezes acometendo amigos com idade semelhante às suas, o que não deixa de ser assustador. O valor conferido
à saúde aumenta exponencialmente.

A essa altura, o sujeito não deveria mais cultivar idolatrias por outros seres humanos, nem por ideologias, nem por nada. Afinal, já teve inúmeros exemplos das imperfeições que nos cercam, o choque de realidade já deve ter causado impacto em várias ocasiões. Essa seria a lógica, muitas vezes contrariada. Há quem ainda superestime personagens da vida cotidiana aos 50, pasmem.

À medida que os filhos crescem e se tornam cada vez mais independentes, começa a surgir nas lacunas do pensamento a indagação “e agora, o quê? ‘, ainda não completamente concretas. Assumo que esse é um dos grandes desafios da próxima década, aprender a viver sem a dependência de quem você ajudou a educar e crescer.

Mas enquanto essa hora não chega, a rotina intensa da” era dos filhos e das contas a pagar” segue cobrando nosso foco e dedicação. Se considerarmos 90 anos como marco do tempo regulamentar de uma vida, estamos aos 5 do segundo tempo. Ainda temos muito jogo pela frente..!

Victor Loyola

Victor Loyola, engenheiro eletrônico que faz carreira no mercado financeiro, e que desde 2012 alimenta seu blog com textos sobre os mais diversos assuntos, agora incluído sob a plataforma do Boteco, cuja missão é disseminar boa leitura, tanto como informação, quanto opinião.

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Um Comentário

  1. Parece-me que a trajetória até a chegada dos 50 é similar para todos os homens. E virão outras experiências até os 59 anos além da maior independência dos que dependem de nós. Boa caminhada e saúde!

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