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And the Oscar goes to… Brasil-sil-sil-sil!

– No seus sonhos mais loucos, Jimmy, imaginava que vocês chegariam tão alto?

– Pra ser honesto, Terry, eu pensei, sim, mesmo no início.

– Tanto quanto os Rolling Stones?

– Rolling Stones? Que p**** é essa, Terry?

Nessa cena de um dos meus filmes favoritos, The Commitments (1991), do diretor Allan Parker, morto há um mês, o sonhador Jimmy Rabitte entrevistava a si mesmo na banheira, imaginando um futuro em que a banda de soul que ele ainda estava formando alcançaria o megaestrelato. Quem nunca? Eu não cheguei a me entrevistar na banheira, mas já me imaginei fazendo um discurso de agradecimento por ser o primeiro brasileiro a ganhar o Oscar, unzinho de Roteiro Original! Pensava em inventar alguma moda, alguma piada interna, como Fernando Meirelles fez quando teve seu nome anunciado na cerimônia: naquela fração de segundo em que seu rosto apareceu para milhões, ele alternou um joinha e um paz-e-amor, à maneira de Didi Mocó!

Não sei por que esse meu plano não deu certo! Talvez pelo fato de meus roteiros mal rabiscados nunca vão chegar nem perto de serem produzidos. Mas prefiro pensar que foi porque os membros da Academia de Hollywood são uns baitas de uns brasileirofóbicos. Isso mesmo, para o próximo Oscar, em vez da hashtag #oscarsowhite, que viralizou no último Oscar, devido à ausência de negros nas categorias principais, proponho agora o #oscarsoantibrazilian. E o problema deles não é com a América Latina, pois nada menos que 41 Oscars já foram para mãos de latino-americanos, incluindo 5 dos últimos 7 na categoria de Melhor Diretor. Tá certo que esses cinco e, na verdade, a grande maioria (26), foram para os mexicanos, ali do lado, mas até um uruguaio (o compositor Jorge Drexler) já levou e nossos hermanos argentinos já ostentam 2 (dois!) Oscars de Filme Estrangeiro (A História Oficial e o ótimo O Segredo dos Seus Olhos) entre os 8 (oito!) que têm em casa. Mas o Brasil já teve alguma chance?

Pra mim, a melhor oportunidade que já tivemos foi, acreditem, com Carlinhos Brown e Sérgio Mendes, indicados a Melhor Canção, da animação Rio, no Oscar em 2012. Não que fosse uma musicaça – era boazinha – mas só tinha um concorrente, uma quase não-música do filme dos Muppets. Porém – assim como Rubinho Barrichello que, mesmo largando na frente em um certo Grande Prêmio dos EUA, perdeu do Schumacher quando só tinha os dois disputando – o gosto (estranho) dos americanos pelos Muppets falou mais alto e perdemos, como sempre. Talvez se os dois compositores, que já fizeram muita coisa boa, estivessem um pouco mais inspirados…

Na verdade, já estivemos presentes na premiação com realizações de qualidades, aí sim, dignas do Oscar. Destaco: Central do Brasil indicado a Filme Estrangeiro e Atriz (Fernanda Montenegro) em 1999; Cidade de Deus indicado a Diretor, Roteiro, Montagem e Fotografia em 2004; e O Menino e o Mundo, em 2016, a Melhor Animação. No entanto, essas indicações deram o azar de enfrentar francos favoritos. Penso que se tivessem sido indicadas em outros anos, talvez teríamos abiscoitado o carequinha.

O premiado (e ótimo) longa O Menino e o Mundo pegou o ano justamente de uma das melhores animações da década da Pixar: Divertidamente (Inside Out). Foi barbada.

O inesquecível Central do Brasil enfrentou a onda do (bom) italiano A Vida é Bela, que levou, além de Filme Estrangeiro, até um inesperado Oscar de Melhor Ator. Também houve, naquele ano, um surpreendente desempenho do razoável Shakespeare Apaixonado, que tomou o Oscar principal de O Resgate do Soldado Ryan. E aí que, em Melhor Atriz, enfrentando a (muito melhor) Fernandona, quem faturou foi a “queridinha” da vez: a Gwyneth Paltrow, em um papel, digamos, simpático.

Cidade de Deus pegou o ano, 2004, em que o último Senhor dos Anéis papou todos os Oscars, não deu nem pro cheiro. Também houve outro problema para o filmão de Meirelles: os anos 2000 foram uma década em que os votantes específicos para Filme Estrangeiro preteriram muitos favoritos ousados em benefício de produções mais caretas. Por isso, Cidade de Deus, apesar de bem incensado, não emplacou como finalista nessa categoria no ano anterior, 2003, quando quem venceu foi o esquecido alemão Lugar Nenhum na África. E aí, como estreou nos EUA depois, pôde ser indicado em outras categorias em 2004. Se estivesse entre os indicados de Filme Estrangeiro em 2003, acho que é certo que teríamos uma estatueta em terra brasilis.

Para o Oscar de 2021, ainda é cedo para saber se temos alguma chance. Por conta da pandemia, poucos filmes elegíveis estrearam, porém alguns sites, como a Indiewire, colocam Bacurau entre possíveis indicados. O ótimo filme de Kleber Mendonça Filho, premiado em Cannes, não pode ser mais indicado a Filme Internacional (novo nome para Filme Estrangeiro), pois se candidatou no ano passado e foi preterido pelo Brasil para o não mais que bonzinho A Vida Invísivel, que não chegou à final. Bacurau teria sido alçado à lista de 5 indicados? Talvez, mas certamente perderia para o grande vencedor do Oscar 2020, o coreano Parasita.

Entretanto, assim como Cidade de Deus, como estreou nos EUA nesse ano, antes da pandemia, Bacurau tem uma nova chance, pois se qualifica para outras categorias. Acho difícil, o filme foi bem criticado, mas não chegou a ser uma sensação no mundo ou nos EUA. O ponto forte é que o tema, sobre reações inesperadas de marginalizados, está na moda: é o mesmo de outros prestigiados recentes pela Academia, todos excelentes, como o próprio Parasita, Coringa, o libanês Cafarnaum e o francês Les Miserables (assistam a todos!). Então, ao menos uma ou outra indicação não acho impossível, mas acho que só vamos ter melhor visibilidade quando houver filmes realmente oscarizáveis estreando nas salas de cinema ou no streaming, talvez no início de 2021. E ainda não conheço os candidatos brasileiros a Filme Internacional, nem ouvi falar de nenhum incensado até agora.

Acho que o mais provável é que vou ter de eu mesmo ir resolver essa bagaça. Vou soprar a poeira dos meus carcomidos roteiros, tentar viabilizar a produção e aí, garotinho, é só ensaiar, na minha banheira, o discurso. E, assim como fez Fernando Meirelles com seu gesto nostálgico, eu já digo que vou iniciar meu discurso com: “Queria mandar um beijo para a minha mãe, para o meu pai e (apontando para a câmera) especialmente pra você, Xuxa!”, pode ser?

Vladimir Batista

Vladimir Batista é escritor, professor e cinéfilo. Após 25 anos trabalhando como engenheiro em multinacionais de tecnologia, resolveu abraçar sua paixão de infância pelas palavras e por contar histórias e segue carreira na área de Letras e Literatura. Gosta de filmes e livros de gêneros variados, atendeu a vários cursos e oficinas de roteiros de cinema, de série e de técnicas de romance e tem um livro publicado pela Amazon: “O Amor na Nuvem De Magalhães”. Vladimir é casado, vegetariano e “pai” de cachorros resgatados.

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