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Aquecimento Global sem politização – parte I

O tema Aquecimento Global é quente, sem trocadilhos, porque está profundamente ligada à questão ideológica.

No caso, por amor à concisão e não à exatidão, doravante usarei o termo Aquecimento Global no sentido de Aquecimento Global antropogênico, ou seja, como um fenômeno causado primordialmente pelo homem.

Meus comentários sobre o artigo publicado sobre o mesmo assunto aqui, estão no final do texto.

O clichê é que setores da esquerda defendem o Aquecimento Global porque a esquerda é contra as grandes corporações, que, segundo a concepção deles, contribuem para destruir o planeta com suas atividades (o que não deixa de ter tintas de verdade, até certo ponto).

Já segmentos da direita enxergam uma grande Teoria da Conspiração porque tal tese, se confirmada, ajudaria pretensamente a justificar estados mais intervencionistas, que não se alinhem às grandes corporações. Assim ONGs ambientalistas e outras forças de esquerda fariam lobby para tentar vender a ideia que o mundo estaria a beira de uma catástrofe (o que contém pitadas de verdade, mas é exagero). Nesse sentido, esse nicho ou nega que esteja acontecendo aquecimento, ou o atribui a causas naturais e não derivado da atividade humana.

Nessa série de artigos, se iniciando por esse, não me cabe entrar no mérito da esquerda ou direita. Afinal, essa discussão não deveria envolver credos políticos ou econômicos, porque se trata de Ciência e não Sociologia, Filosofia, Política ou Economia.

O romancista escocês Tobias Smollett (1721–1771) muito sabiamente dizia: Fatos são Coisas Teimosas. Como tal, eles estão alheios aos desígnios de nossa vontade.

Também não quero balizar a defesa desse ou daquele lado baseado na opinião do cientista A ou B. Isso não seria prosa científica, apenas apelo à autoridade.

Na primeira parte, falarei do conceito e das evidências do acomo um todo. Na segunda parte, descreverei um case em relação à mídia e detalharei uma história de fraude de um cientista brasileiro, na terceira parte mostrarei evidências menos óbvias, e na quarta parte comentarei um pouco sobre os detratadores do aquecimento global e seus financiadores.

É óbvio que existem também interesses econômicos dos agentes econômicos ligados a formas alternativas de energia que tem interesse em divulgar previsões catastróficas e exageradas sobre o Aquecimento Global e que isso acontece, em certa medida.

O problema é que, cinicamente falando, ´há muito menos dinheiro por pessoa a ser corrompida.

De um lado há menos dinheiro na mesa do lado das corporações ligados à energia alternativa do que relativo às grandes corporações de petróleo e gás (a menos que se acredite em teorias da conspiração) e, adicionalmente, há muito mais cientistas, governos, universidades e instituições de pesquisa que defendem o Aquecimento Global do que aqueles que o contestam.

A minha ideia é explicar um pouco sobre o Aquecimento Global, sob o prisma de um leigo. Para tal pesquisei muito partindo de um quadro em branco, sem ideias preconcebidas, que é a mesma postura que peço a meu leitor, desde que ele tenha alguma lembrança de Ciências do tempo do Ensino Médio.

Vamos então fazer essa “viagem”, passeando por 16 perguntas que podem nos ocorrer, quando pensamos nesse tema. Afivelem os cintos de seguranças e lá vamos nós:

1) Como é a energia do Sol que chega na Terra?

O sol emite na sua superfície as chamadas ondas eletromagnéticas, com vários comprimentos de onda. bem pouca energia sob a forma de ondas de rádio ou micro-ondas, mas quase tudo se concentra na faixa do infravermelho, luz visível e ultravioleta. Há ainda algo de raios X. Já os raios gama, altamente radioativos, são, em geral, absorvidos até chegar a superfície do Sol e raramente chegam à Terra.

Espectro Eletromagnético – Fonte: Khemis [CC BY-SA 4.0 via Wikimedia Commons]

2) Como a absorção da energia do Sol pela atmosfera nos protege?

A atmosfera terrestre, por sua vez, altera a composição original da energia solar. Os raios-X são quase totalmente absorvidos pela alta atmosfera. O ultravioleta é, em boa parte, absorvido pela camada de ozônio e também pelas nuvens, quando presentes. Assim a energia do Sol que chega à Terra está sob a forma de ondas de luz visível, acompanhada de um pouco de infravermelho e ultravioleta.

A faixa de comprimento de onda do infravermelho é enorme!

Na figura acima ilustra-se o espectro da energia solar recebida pela Terra, que corresponde à 99% da energia recebida:

Sem essa filtragem pela atmosfera, a Terra se tornaria um lugar inóspito.

3) O que é a temperatura e sua sensação?

A temperatura do ar é proporcional à energia com que as moléculas de ar se movem (*1), já a sensação térmica, que alguém sente, está associada não apenas à temperatura, mas também à quantidade de colisões de moléculas de ar com o corpo da pessoa.

As colisões transferem energia da parte onde as moléculas estão mais rápidas para o lado onde as moléculas estão mais lentas. Isso significa que se o ar estiver mais quente que o corpo, a energia flui do ar para o corpo. Caso contrário, o fluxo se dará no sentido contrário.

No espaço, a temperatura é muito baixa, mas a densidade de moléculas é quase nula. Assim, quase não há sensação térmica porque não há praticamente moléculas colidindo com o corpo, portanto o corpo praticamente não ganha nem perde calor. Isso vai contra a intuição da maioria das pessoas que imagina que existe um frio congelante no espaço. A proporção de infravermelho vindo do sol também é baixa e assim ela é pouco efetiva para “esquentar” o corpo.

Na superfície terrestre, na troposfera, quanto maior a altitude, menor a temperatura: a camada de ar para cima é menor, mais rarefeita, assim há menor absorção de energia solar e a reemissão dessa energia como infravermelho.

Já a sensação térmica (*2) de uma temperatura baixa em uma altitude alta versus a mesma temperatura no nível do mar é diferente. Em altitudes maiores, o ar é menos denso e gera menos colisões com o corpo, diminuindo as perdas de calor do corpo, assim a mesma temperatura baixa tende a ser percebida como mais fria no nível do mar.

4) Qual a relação do infravermelho com a temperatura?

Vale dizer que o infravermelho é o meio básico de transmissão de calor na Terra pelo ar sem a necessidade de existência de partículas (calor radiante).

O infravermelho representa, perto da temperatura ambiente, a maior parte da energia emitida pela matéria, como resposta à absorção de energia de diferentes frequências, que consiste na radiação de corpo negro.

O infravermelho transmite bem o calor porque está na faixa de frequências da energia eletromagnética mais eficiente para transmitir movimento, através de ressonância, às moléculas em certas faixas de temperatura, como as que estão na superfície da Terra, devido às propriedades da Mecânica Quântica. E o calor em escala macro está ligado ao movimento em escala micro.

Isso ocorre a despeito do fato que o comprimento médio de uma onda do infravermelho ´é bem maior que a luz visível e a luz ultravioleta, portanto a energia conduzida por ela, dada pela equação de Planck-Einstein
(E =q c / λ, onde q é a constante de Planck, c é a velocidade da luz e λ é o comprimento de onda) em tese diminui, em função do comprimento de onda (λ) estar no denominador.

Esse tópico é essencial para entender, mais abaixo, o mecanismo do Efeito Estufa.

5) O que é o efeito estufa e como simulá-lo aproximadamente?

O efeito estufa é a absorção pela atmosfera de parte do infravermelho reemitido pela Terra após a absorção da energia vinda do Sol.

Aqui temos um exemplo prático do Efeito Estufa. Uma estufa de plantas é uma forma inteligente de preservar o calor dentro dela, já que a estufa é toda rodeada de vidro, que é quase opaco ao infravermelho. Assim o calor interno produzido pela absorção da energia do sol com pouco infravermelho, se torna rico em infravermelho dentro da estufa, a partir da absorção da energia solar e sua reemissão.

No entanto, a analogia da estufa da plantas não é tão boa, pois é verdade que a energia infravermelha fica retida dentro da estufa, mas também é verdade que a convecção de calor para fora não acontece, ou seja, o ar quente fica retido dentro da estufa preso pelo vidro. Quem fica dentro de um carro fechado em um dia ensolarado, também sente esse fenômeno de forma bem patente.

Estufa pode ficar quente, mesmo que esteja em um local bem frio.

No entanto, a estufa é efetiva, mesmo que fora da estufa esteja bem frio e o infravermelho é parte da explicação.

Essa opacidade ao infravermelho ocorre quando a energia infravermelha tenta escapar da Terra, o que faz com que a Terra fique mais quente, constituindo-se no efeito estufa.

6) Como funciona o balanço da energia que o Sol nos proporciona?

Bem, se não fosse o Sol, seríamos um planeta gelado, escuro e sem vida. Assim, quase toda a energia que a Terra recebe de fora vem do Sol, a menos de fenômenos vulcânicos isolados, que vem de dentro.

Da energia que chega na atmosfera terrestre proveniente do Sol, 30% é refletida (albedo) para o espaço pela claridade do planeta e das nuvens. Dos 70% restante que sobra, 19% é absolvido pelo ar ou pelas nuvens e 51% chega ao chão. O calor gerado pela superfície terrestre, emitido como infravermelho, fugiria da Terra, mas a atmosfera o retém e manda uma parte de volta para a Terra, formando um ambiente similar a uma estufa.

Balanço Energético do Sol (watts por metro quadrado) (*3)

Isso pode ser visto na grande seta bege que aponta para a superfície da Terra na figura acima, vindo da atmosfera, com o rótulo Radiação de retorno. Ou seja, os gases do Efeito Estufa funcionam de forma similar ao vidro da estufa de plantas.

7) Por que alguns gases apresentam Efeito Estufa, enquanto outros não?

Isso é realmente complicado explicar, porque envolve Mecânica Quântica.

O gás carbônico (CO₂) absorve infravermelho e reemite apenas um pedaço dela. Podemos dizer que o CO₂ apresenta uma “cor” para o infravermelho, já que a cor de um objeto representa justamente a parte do espectro visível que incide sobre ele e é refletida. A diferença é que há uma absorção seguida de uma reemissão e não uma reflexão difusa direta, como no caso da cor. Essa dispersão é que faz o céu parecer azul para os nossos olhos.

simplified diagram of the greenhouse effect
IR emitido pela Terra é absorvido e s´o parcialmente reemitido por CO2, CH4, H20, etc

De fato, os principais componentes da nossa atmosfera, como oxigênio (O₂) e nitrogênio (N₂) e os gases nobres, como argônio e xenônio; não são moléculas que contém regiões com cargas diferentes (dipolo elétrico), nem permite que um dipolo elétrico seja induzido.

A situação muda para outros gases como vapor d’água (H₂0), gás carbônico (CO₂), ozônio (O₃), metano (CH ₄), óxido nitroso(N2O) e vários outros gases produzidos pelo homem, como os gases fluorados: nesse tipo de molécula forma-se regiões com cargas diferentes (dipolos elétricos), que gera uma vibração, que, por sua vez, possibilita a absorção e emissão seletiva de raios infravermelhos (calor).

8) Dá para simular o Efeito Estufa no conforto de sua casa?

Sim! É relativamente fácil.

Há uma experiência simples que qualquer um pode fazer com materiais simples.

Nessa experiência singela, enche-se 2 garrafas de refrigerante parcialmente com água. Veda-se as garrafas de algum modo e usa-se 2 termômetros. Nesse caso, o autor conectou os termômetros ao computador para monitorar a temperatura. E, em apenas uma das garrafas, ele colocou 4 tabletes da Alka Seltzer (popular antiácido em forma de tablete vendido nos EUA que contém ácido cítrico e bicarbonato de sódio), gerando a seguinte reação química:

C6H8O7 (ácido cítrico) + 3 NaHCO3 (bicarbonato de sódio) ➔
3 H2O + 3CO2 + Na3C6H5O7 (citrato de sódio)

Depois, ele acendeu uma lâmpada, que serve como fonte de calor para as 2 garrafas.

Depois de cerca de 1 hora, é possível observar a diferença na temperatura do ar nas 2 garrafas no monitor do computador.

Experiência bem simples. A única diferença entre as 2 garrafas é o CO2 em uma delas.

Outra forma de fazer a mesma coisa é usar bicarbonato de sódio com vinagre para gerar a seguinte reação química, com o mesmo resultado final:

NaHCO3 (bicarbonato de sódio) + HC2H3O2 (ácido acético do vinagre) ➔
NaC 2 H 3 O 2 (acetato de sódio) + H 2O +  CO 2 .

Outra experiência é visualmente mais impactante, mas é mais voltada para laboratórios.

E nesse pequeno vídeo observa-se diretamente a absorção de infravermelho com a introdução da CO2, com um câmera infravermelha.

9) Efeito estufa pode ser benéfico?

Sim, na verdade, ele é essencial para a vida como nós conhecemos.

Se a Terra fosse um corpo negro sem atmosfera, que não refletisse nenhuma luz; sua temperatura seria de 5.3º C (*4). Como 30% da energia é refletida (albedo), a temperatura teórica cairia para -18ºC. Só que a temperatura média da terra é de 14ºC.

Por quê? A resposta é o Efeito Estufa, que, como dissemos, devolve o infravermelho emitido pela terra de volta para ela, o que eleva a temperatura teórica de -18ºC para 14ºC, ou seja, 32ºC.

10) Se o Efeito Estufa é importante para o nossa sobrevivência, por que temos um problema?

O questão é que o homem, especialmente nos últimos 100 anos, tem aumentado artificialmente a emissão de gases associados ao Efeito Estufa, devido à aceleração de suas atividades econômicas, incluindo a queima em grande escala dos combustíveis fósseis.

Assim, pelas explicações prévias, há uma tendência em aumentar a temperatura do ar, assim como acelerar o derretimento dos gelos e e elevação do nível dos mares e oceanos.

No gráfico abaixo, plotou-se a temperatura média da Terra desde 1850, calculada a partir de diversas estações em muitos países (com correções e ajustes para endereçar a questão do aumento da urbanização e sua influência nos termômetros). Desse modo, é possível observar que a temperatura média no planeta aumentou cerca de 0,73 ºC nos últimos 40 anos, no período de 1981 a 2021, o que representa cerca de 0.18 ºC por década, o que é uma clara aceleração de ritmo sobre as décadas anteriores. Por exemplo, entre 1900 e 1981 (81 anos), observa-se uma subida média de cerca de 0,06 ºC por década.

Temperatura média na Terra medida por 5 diferentes instituições

A variação do nível do mar é exibida abaixo.

Abaixo as previsões catastrofistas: o mar está se elevando agora a 3,5 cm por década

IPCC ( Intergovernmental Panel on Climate Change), sediado na Suíça é o principal instituto mundial de pesquisa sobre a mudança de clima e já fizerem, desde 1990, seis estudos em larga escala sobre a questão de mudança de clima, o último em 2021.

A previsão do IPCC feita em 1995 no segundo estudo, fala em uma faixa de previsão com mediana de 2ºC para o período de 1990 a 2100.

Essa previsão do IPCC, até agora, está em linha com o que aconteceu nos 26 anos que se seguiram, visto que 110/40 * 0,73ºC ~ 2,0ºC.

11) Quais são os gases mais importantes para o efeito Estufa?

Os 3 gases mais importantes para o efeito estufa provocado pelo homem na Terra são o gás carbônico (CO2) o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O), que juntos respondem por 97% da emissão de gases nos EUA em 2019.

No caso do gás carbônico (CO₂), o total emitido por atividades humanas é muito abaixo da emissão natural (respiração, vulcões, decomposição) que se equilibrava com a absorção natural, via fotossíntese. Em suma, nesse ponto os detratores do Aquecimento Global estão certos, só que o total absorvido naturalmente também é gigantesco e havia antes um delicado equilíbrio entre a emissão e a absorção de CO2.

Essa conclusão vem de medidas diretas que iniciaram em 1958 e determinações indiretas do nível de CO₂ atmosférico, a partir de análises das bolhas de ar presas em núcleos de gelo, que permite estimar esse valor anteriores à 1958.

O ciclo completo do CO₂ na Terra é denominado de Ciclo do Carbono e é ilustrado abaixo:

A emissão humana é pequena perante as trocas naturais. Números são em bilhões de toneladas por ano. Para se ter uma ideia, um carro popular à gasolina, rodando 20/30 km por dia, emite 1 tonelada de CO.

E então, especialmente a partir dos anos 50, o delicado balanço entre o CO₂ emitido e absorvido pela atmosfera terrestre foi rompido pela intensificação da atividade humana, como pode ser visto abaixo, na evolução da concentração de CO₂ pelos séculos.

No gráfico abaixo, exibe-se a evolução da emissão humana de CO2 (em gigatons – 109 toneladas) e da concentração de CO2 desde 1750. Em novembro de 2021, a concentração medida de CO2 na atmosfera foi de 415,01 ppm.

A coincidência da aceleração das 2 curvas é claramente visível

Uma concentração de 415 partes por milhão significa que existem na atmosfera 415 moléculas de CO2 para cada 1 milhão de moléculas de gás, o que representa uma concentração recorde na atmosfera nos últimos 3 milhões de anos.

Apesar do aumento de temperatura, diminuir a solubilidade do CO2 na água, o aumento de temperatura da água não foi o suficiente para fazer do oceano um emissor de CO2. O próprio oceano tem absorvido CO2. Aliás, muito pelo contrário. O PH médio da água já baixou 0.1, o que representa um crescimento de 30% de acidez.

Aumento de concentração de CO2 também nos oceanos

Agora, de fato, explicar, de forma inteligível, como uma concentração aparentemente tão baixa de CO2 pode implicar em uma variação significativa da temperatura pode ser algo desafiante. Imaginem uma emissão de infravermelho tentando “escapar” da Terra atravessando quilômetros de atmosfera com essa concentração de 415 partes por milhão. Qual a média de energia que deveria ser absorvida?

Um artigo de 2018 (Coeficiente de absorção de CO2 através da troposfera), bem técnico, tenta explicar esse fenômeno, que não parece muito intuitivo.

Além disso, há um ciclo perverso, porque quanto maior a temperatura, maior a evaporação dos oceanos e, portanto, maior a concentração de vapor d´água (H₂0) na atmosfera, que também gera Efeito Estufa. Por outro lado, mais vapor d’água pode significar mais nuvens e portanto aumentaria o albedo, enquanto o derretimento dos polos diminui o albedo. A conjunção desses fatores pode ser complexa, mas não diminui o fato (aumento de temperatura) observado até agora.

Note que se o CO2 em baixa concentração não fosse efetivo para esquentar o planeta, não teríamos vida na Terra nem hoje e nem na era pré industrial, como vimos na pergunta 9 acima, já que a concentração natural dos outros gases responsáveis pelo efeito estufa era muito baixa.

Nada mais natural que se 280 ppm de CO2 na atmosfera, mais o vapor d’água, gerava condições para vida em 1900 (já que sem atmosfera seríamos uma planeta gelado); é muito razoável supor que 415 ppm também dã condições de vida, só que com um pouco mais de calor…

O metano (CH4) é menos comentado que o CO2, mas além de contribuir para a formação de ozônio perto da superfície, que é tóxico, é um gás muito mais potente para provocar o efeito estufa do que o gás carbônico, embora dure apenas uns 12 anos na atmosfera. Mesmo estando presente em concentrações mais baixas que o CO2, estima-se que ele responda por cerca de 30% do aquecimento global.

Pelo gráfico abaixo, podemos ver que a concentração de metano na atmosfera já se aproxima de 1,9 ppm em 2021.

Ao contrário do CO2, estima-se que emissão humana de CH4 seja mais da metade do total.

Em relação ao óxido nitroso, ele é bem menos tóxico que o CH4, mas, em termos de efeito estufa, é 300 vezes mais potente que o CO2, além do potencial dano à camada de ozônio na estratosfera. Estima-se que cerca de 75% da emissão vem da agricultura. Pelo gráfico, é possível observar uma aceleração impressionante da concentração de N2O no ar nos últimos anos.

A concentração de N2O já ultrapassou 331 ppb

12) O Sol não poderia ser a causa primordial do Aquecimento Global?

A ideia seria que as variações das erupções solares, manchas solares e outras atividades do sol; ao longo do tempo, poderiam estar conduzindo o aumento de temperatura, ao invés das atividades humanas.

Para se entender porque essa não é uma explicação plausível para o recente aumento de temperatura do planeta, é preciso antes falar sobre a Irradiância Solar Total (TSI,na sigla em Inglês):

A Irradiância Solar Total (TSI) consiste na energia total incidente originária do Sol sobre uma hipotética área perpendicular ao raio solar que chega, em um determinado período de tempo.

A superfície plana perpendicular à incidência é menor que o naco correspondente de superfície da Terra

Quanto menos vertical essa energia incide, maior a superfície onde a energia se espalha e mais frio fica. Isso explica porque a região perto dos polos é tão gelada.

A flutuação da TSI ao longo do ano é de cerca de 7%, em função da órbita da Terra em torno do Sol não ser perfeitamente circular.

A TSI varia atualmente em torno de 1360 W/m². Só que quando se considera toda a superfície da Terra, a média é bem menor do que isso porque a incidência raramente é vertical nos diferentes pontos da superfície terrestre.

A área da seção cruzada da Terra onde o raio (R) incide perpendicularmente é πR², que corresponde a área do maior círculo da Terra, que seria a superfície plana da metade de uma laranja, se a cortássemos exatamente pelo meio.

A área da superfície da Terra, aproximadamente uma esfera, é 4πR². Desse modo, temos que dividir a TSI por 4, para considerar o valor médio sobre a superfície da Terra.

Portanto, o valor de 341 W/m² na figura de topo com a legenda Entrada de Radiação Solar, que corresponde a ¼ da TSI, quando multiplicado pela área da superfície da Terra (510.000.000.000.000 m²) permite estimar a energia solar total que alcança o topo da atmosfera em um segundo (174.226.942.644.300.000 W).

A partir desse valor, percebe-se que há uma imensa quantidade de energia solar que poderia ser aproveitada para a geração de energia, considerando que, como vimos acima, 51% desse total chega até a superfície.

O gráfico abaixo mostra a variação do TSI ao longo do tempo. Hoje em dia, ele é medido com mais precisão por satélites.

A linha vermelha (temperatura) claramente se desloca em relação à linha azul (TSI)

A variação da TSI em um espaço de poucos anos parece errática a primeira vista. Olhando de forma mais cuidadosa, existe um ciclo de 11 anos, que reflete um ciclo de atividade solares, que inclui manchas e erupções solares.

No entanto, tomando a curva que plota em cada ponto a média dos últimos 11 anos (média móvel), para eliminar a variação mais forte ano a ano, percebemos claramente que nos últimos 50 anos a temperatura sobe regularmente, ainda que a atividade solar esteja apresentando uma leve baixa.

13) Como explicar porque a energia vinda do Sol varia?

Ao contrário do que os leigos, podem pensar, a variação anual da distância entre a Terra e o Sol é pequena, e não explica as estações do ano (a obliquidade dos raios do Sol em diferentes partes da Terra é que explica, como mostrado acima) e muito menos a extensão da variação da energia irradiante do Sol.

No periélio – menor distância – o Sol está a aproximadamente 147 milhões de quilômetros da Terra; no afélio – maior distância – está a uns 152 milhões de quilômetros do Sol, ou seja, uma variação de apenas 3,4%!

Se a distância não é uma causa importante da variação do total de energia solar que chega à Terra, qual seria? 

São as manchas solares, que estão ligadas a zonas na superfície do Sol mais escuras e com temperaturas mais baixas, o que implica, paradoxalmente, em maior emissão de energia pelo Sol. Assim, quanto mais manchas, mais energia solar alcança a Terra.

E essas manchas é que tem um ciclo que foi medido de 11 anos, onde a tendência se repete.

O ciclo nas manchas solares, junto com o recente aquecimento global, é que explica quase toda a macrovariação da temperatura média do planeta ao longo das últimas décadas.

Um gráfico confrontando a temperatura, as manchas solares e a concentração de CO2 pode ser visto abaixo:

Havia uma boa correlação entre temperatura e manchas solares. Não mais…

E essa pasmaceira do Sol já acontece há centenas de anos, expresso pela análise das manchas solares. Aliás o mínimo de Maunder do século XVI e XVII é superestimado.

Manchas solares são muito correlacionadas à energia que o Sol emite.

E isso pode também ser visto de outra forma: existem técnicas que estimam diretamente o TSI (Total Solar Irradiance) em um passado mais remoto, abrangendo inclusive o período que muitos chamam de Mini Era Glacial (LIA em inglês), que ao longo de todo período variou muito pouco:

A variação total no TSI é de apenas 0,15% desde 1600.

Estimativas de temperatura desde o ano 0 variam bastante, mas mostram claramente que o tempo recente é o período de maior aquecimento de toda a histórica recente, mesmo diante dos períodos conhecidos como período quente medieval e da pequena era do gelo (há teorias que dão muito mais importância ao vulcanismo nesse fenômeno):

Spike mais recente na temperatura impressiona.

14) Não pode haver outra causa para o Aquecimento Global?

No passado distante, a composição da atmosfera, o albedo, a órbita, a atividade vulcânica e a irradiância solar total eram diferentes do que no mundo moderno.

Esse paper (CO2-forced climate thresholds during the Phanerozoic – 2005) estudou detalhadamente a relação entre concentração de CO2 e temperatura nos últimos 542 milhões de anos (Fanerozoico), ressaltando outros fatores intervenientes. Uma corrente sustenta que o H2O e não o CO2 teve e tem esse papel, afirmação que não se sustenta com estudos detalhados, que mostram que como o CO2 não se condensa, ele serve para fornecer a estrutura de temperatura estável que sustenta os níveis atuais de vapor de água atmosférico e nuvens por meio de processos de feedback.

Entretanto, tais considerações são irrelevantes para a análise dos últimos 50 anos, já que o período de tempo é muito curto.

Nas últimas décadas a conformação de continentes, oceanos e nuvens (que determinam o albedo, isto é, a refletividade da energia solar), a composição macro da atmosfera, a órbita da Terra, o nível de atividade vulcânica e a energia total do Sol que chega a Terra (TSI); permaneceram basicamente inalterados.

Abaixo um gráfico que mostra a estabilidade do albedo:

Desse modo, diferentemente do passado longínquo, só sobram duas variáveis que não ficaram constantes: a temperatura e a concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera.

Assim, não há muita alternativa senão relacionar uma variável (gases estufa) com a outra variável (temperatura), dado que o resto ficou praticamente inalterado. Ainda mais quando há uma explicação científica bem plausível para essa relação.

15) Como a lei da Conservação de Energia se liga ao Aquecimento Global?

De forma bem sintética, o aquecimento global é decorrente do princípio da conservação de energia!

Em uma dada unidade de tempo, a equação abaixo tem que valer:

Energia que chega do Sol ou do interior da terra = Energia que sai da Terra + Energia adicional que fica na Terra.

Vale destacar que a atividade vulcânica (que seria a tal energia vinda do interior da Terra) não tem muita relevância nessa equação.

Entende-se como energia que fica na Terra, o calor na troposfera, a camada baixa da atmosfera junto à superfície, mais toda a água (oceanos, mares etc), e todo o gelo (geleiras, região dos polos etc).

Como se constatou que a energia que sai da Terra para o Sol está menor que a energia que chega do Sol para a Terra, e o calor não penetra muito dentro da rocha, conclui-se que o calor total perto da superfície da Terra tem que estar aumentando, o que é coerente com a elevação de temperatura observada, o degelo e o aumento do nível do mar.

Saldo energético da Terra, descrito nesse artigo.

Repare que a maior parte da superfície do planeta é coberta de água, assim a água também está aquecendo: cerca de 0,07oC por década, com aceleração a partir de meados da década de 80, como pode ser conferido abaixo. E a água não pode ser vista como algo separado do clima, porque ela o influencia!

O nível médio do mar só cresce desde 1960.

Se a temperatura média da superfície dos oceanos está aumentando, isso indica claramente que a energia armazenada nos oceanos está aumentando também, a não ser que alguém acredite na hipótese muito improvável de enormes zonas quentes delimitadas no mar sem isolamento e sem serem detectadas pelo homem, como vilão, e que persistem por décadas.

Como o saldo energético da Terra era quase 0, não havia espaço para o mar ter se aquecido antes, fato não detectado pela evolução da temperatura de sua superfície, para depois passar a ser o vilão do aumento de temperatura do ar das décadas mais recentes.

Para o mar ter se aquecido, de forma invisível, com as tais zonas quentes, o ar teria que ser esfriado, desconsiderando vulcões e gelo, o que não aconteceu.

E já que a energia vinda do Sol não teve grandes alterações e que o saldo energético positivo é algo mais recente, que fenômeno louco transformaria o mar de absorvedor de energia no passado para emissor de energia nos tempos atuais?

16) Ah, mas está fazendo muito frio em ….

Todo o modelo de análise de temperatura para o Aquecimento Global refere-se à temperatura global anual que é uma média.

A modelagem de variação da temperatura local em uma dada época do ano é ainda muito mais complexa do que a temperatura global anual.

Nenhum proponente do Aquecimento Global jamais alegou que todas as épocas do ano em todos os locais a temperatura ficará mais alta. Isso seria uma bobagem irrestrita.

Em relação aos últimos invernos rigorosos no Hemisfério Norte, os cientistas estão propondo explicações, relacionando-os com o derretimento do Ártico.

Previsões catastrofistas furadas, como o fim iminente das neves eternas na montanha Kilimanjaro na África, ajudam a minar a credibilidade do Aquecimento Global junto ao grande público.

Há manipulação quando se escolhe anos específicos

Esse assunto precisa ser tratado sob um ângulo mais científico e menos sensacionalista, para que os defensores da tese do Aquecimento Global não incorram nos mesmos erros de seus detratores.

Afinal, dificilmente um aumento de temperatura de pouco mais de 0,7oC em 40 anos, como mostrado acima, teria o efeito de acabar com a neve de Kilimanjaro…

✷✷✷

Se o leitor acompanhou atentamente todas as explicações acima, o Aquecimento Global causado principalmente pela atividade humana fica praticamente demonstrado.

No entanto, a previsão precisa das consequências do Aquecimento Global para a Sociedade é bastante difícil. O IPCC divulga faixas bem largas de previsões sobre o nível do mar, temperatura, etc. Quando se extrapola as previsões para aumento de desastres naturais, efeitos no abastecimento de água; fica ainda mais complexo.

De todo o modo, discorrer sobre o que a Humanidade deveria fazer diante desse quadro é um assunto que, aí sim, extrapola a Ciência para entrar na seara da Política e Economia.

Epílogo

Esse longo artigo é um contraditório ao artigo Aquecimento Global Antropogênico – uma ameaça climática ou retórica?, publicado no Papo de Boteco, mídia democrática que aceita muito bem ideias divergentes.

Ainda que esse artigo seja bem escrito e elenque fatos interessantes, não há nada no seu cerne que refute de fato o Aquecimento Global (AG).

Quantos aos cientistas citados que não acreditam no AG, publicarei um artigo especial sobre eles.

Relativos aos eventos extremos, eles estão mais no campo das possíveis consequências do que como argumento contra o AG.

Mesmo que eventos extremos não estejam acontecendo com maior frequência, isso em si não refutaria o AG.

Cumpre ressaltar que, como vimos acima, a melhor métrica para ser medida ligado ao AG é o aumento médio ano a ano da temperatura na Terra.

As consequências desse aumento são muito difíceis de serem modeladas matematicamente, ao contrário das causas.

Quanto à diminuição dos riscos ligados ao clima, isso também está relacionado às medidas de mitigação de risco que foram tomadas. Isso vale para acidentes aéreos na aviação comercial, também na Fòrmula1 e diversas outras atividades humanas.

Mesmo em relação ao tema abordado, ilustrado por alguns casos, há diversos artigos científicos que evidenciam o oposto.

Por amor à concisão, vou me limitar a mostrar a figura um artigo da Nature (2019) que compilou todos os dias com chuva acima do percentil 99 a partir de uma base de precipitação do período até 1980 na Europa.

Em verde são os dias de mm de chuva acima do percentil 99% na Europa s/ período 1951-1980

✷✷✷

A foto que ilustra o artigo é real. Geleiras e glaciais têm recuado visivelmente.

Notas de Rodapé

(*1) A equação da energia cinética de um gás é T = 2C/3k, onde C é a energia cinética média (1/2mv ²) das partículas do gás, k é a constante de Boltzmann e T é a temperatura absoluta em Kelvin. Como se vê pela fórmula, a temperatura não depende da densidade do gás, mas a sensação dela sim, devido sua relação com a intensidade de troca de calor entre o corpo humano e o gás.

(*2) A sensação térmica que uma pessoa sente não depende apenas da temperatura, da densidade do ar e das ondas infravermelhas. Outros fatores relevantes incluem o metabolismo da pessoa, a velocidade do vento e a umidade do ar.

O vento refresca porque ele remove a camada vapor/ar em torno da pele, favorecendo a evaporação do suor. Por outro lado, quando há frio e vento, a remoção da camada de calor ao redor da pele é acelerada, expondo-a a um frio mais intenso, sem filtros.

Um clima quente úmido agrava a sensação térmica, porque ele diminui a evaporação do suor, devido à saturação de água no ar. Já no clima frio, quando quase não se sua, o efeito é o inverso, porque o ar úmido é um condutor de calor levemente melhor que o ar seco, portanto a remoção de calor do corpo é mais eficiente, agravando a sensação de frio.

(*3) Em todos os fluxos, a energia que entra é igual a energia que sai. Por exemplo, a energia que é absorvida na atmosfera (78 + 17 + 80 + 356) é igual a energia que é liberada da atmosfera (333 + 199). Do mesmo modo, a energia que é absorvida pela superfície ( 333 + 161) é igual a energia que é emitida pela superfície (396+17+80). Finalmente, a energia que entra na Terra (341) é igual a energia que sai da Terra(102+239). Tudo em watts por metro quadrado. Watt é uma unidade de potência e não de energia, porque está se falando de fluxo de energia por unidade de tempo.

(*4) Sem a atmosfera, a energia (E) que entra na Terra vindo do Sol, descontando o Albedo (A) ~ 30%, se igualaria à energia S emitida pela superfície esférica (4 π R2) de um corpo negro (aproximação), onde R é o raio da Terra.

Ora, a energia E que entra por unidade de tempo é a potência / área vindo do Sol, algo que é medido e gira em torno de 1.361 W/m2. Isso deve ser multiplicado pelo maior seção da esfera (π R2) em que incide a energia do Sol. Assim:

S = σ T4 (pela Lei de Stefan–Boltzmann), onde σ é constante de Boltzman ( 5,6697 ×10-8) e T é a temperatura em Kevin.

Desse modo, se chega à

E π R2 (1 – A) = (σ T4 ) 4 π R2

Finalmente, isolando T e depois substituindo os valores, temos:

T = ∜ (E (1-A)/4σ) ~ 255 K ~ -18ºC

Se A (Albedo) = 0, a temperatura da Terra subiria para cerda de 5,3%ºC,

Paulo Buchsbaum

Fui geofísico da Petrobras, depois fiz mestrado em Tecnologia na PUC-RJ, fui professor universitário da PUC e UFF, hoje sou consultor de negócios e já escrevi 3 livros: "Frases Geniais", "Do Bestial ao Genial" e um livro de administração: "Negócios S/A". Tenho o lance de exatas, mas me interesso e leio sobre quase tudo e tenho paixão por escrever, atirando em muitas direções.

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