Esporte

A Lei de Guardiola (posso prever o campeão?)

Pep Guardiola escreve no seu livro “Guardiola Confidencial” sobre a necessidade de se iniciar e terminar bem o campeonato por pontos corridos para a conquista do título, mas a tese, popularmente conhecida por “Lei de Guardiola”, se comprova na prática?

Entra ano e sai ano, quando chegamos à 8ª rodada do campeonato brasileiro, a imprensa esportiva corre para as estatísticas e verifica a famosa ““lei de Guardiola”” para tentar adivinhar quem será o campeão do ano, ou pelo menos apontar os favoritos.

Não resisti à tentação e fui atrás dos dados.

Para início de conversa, estamos com jogos atrasados e, portanto, não temos com exatidão a classificação do campeonato nesse ano, mas podemos adaptar levando-se em conta o aproveitamento de cada time e posicioná-lo no contexto de Guardiola.

Abaixo transcrevo a classificação atual do campeonato brasileiro, por aproveitamento, mostrando uma eventual pontuação em 38 rodadas (explico adiante a extrapolação):

Classificação Brasileiro 2020

Time Jogos Aproveitamento Pontos Pontos 38ª Rodada
Atlético Mineiro 07 71,43% 15 81
Internacional 08 70,83% 17 81
São Paulo 08 66,67% 16 76
Vasco 07 66,67% 14 76
Palmeiras 07 61,90% 13 71
Flamengo 08 58,33% 14 67
Santos 08 45,83% 11 52
Fluminense 08 45,83% 11 52
Corinthians 07 42,86% 09 49
10º Bahia 07 42,86% 09 49
11º Sport 08 41,67% 10 48
12º Ceará 08 41,67% 10 48
13º Grêmio 07 38,10% 08 43
14º Botafogo 07 38,10% 08 43
15º Fortaleza 08 33,33% 08 38
16º Athlético 08 29,17% 07 33
17º Coritiba 08 29,17% 07 33
18º Atlético-GO 07 28,57% 06 33
19º RB Bragantino 08 25,00% 06 29
20º Goiás 06 22,22% 04 25

Vamos aos anos anteriores:

Analisei dos anos de 2006 até 2019, porque foi apenas em 2006 que se consolidaram vinte times disputando a série A. Em estatística, quatorze tabelas nos dá um universo de dados muito pequeno, mas à medida que nos aprofundamos percebemos que a lei não é infalível, entretanto podemos limitar o número de times candidatos ao título por exclusão.

Ano Campeão Posição na 8ª Rodada Pontos na 8ª Rodada % na 8ª Rodada Distância (Pontos) para líder na 8ª Rodada Pontos na 38ª Rodada
2006 São Paulo 16 66,67% 03 78
2007 São Paulo 14 58,33% 03 77
2008 São Paulo 13 54,17% 06 75
2009 Flamengo 11 45,83% 06 67
2010 Fluminense 16 66,67% 02 71
2011 Corinthians 20 83,33% 00 71
2012 Fluminense 18 75,00% 01 77
2013 Cruzeiro 15 62,50% 01 76
2014 Cruzeiro 16 66,67% 00 80
2015 Corinthians 13 54,17% 05 81
2016 Palmeiras 16 66,67% 03 80
2017 Corinthians 20 83,33% 00 72
2018 Palmeiras 11º 11 45,83% 06 80
2019 Flamengo 14 58,33% 08 90

Pep Guardiola escreve, entre outras coisas, que uma diferença aceitável para o líder da competição é de no máximo quatro pontos após a 8ª rodada, possibilitando uma recuperação e que o campeão estará na 8ª rodada, pelo menos, entre os seis primeiros.

Entretanto, temos que, de quatorze campeonatos brasileiros, em cinco deles, o campeão estava a mais de quatro pontos distante do líder na 8ª rodada, e em todas essas cinco ocasiões estava abaixo da sexta colocação. A tese de Guardiola, em princípio, não se aplica na totalidade para o nosso campeonato.

Vamos então, tentar realizar exclusões para o atual campeonato, para, pelo menos, indicar favoritos, usando as teses de Guardiola.

Excluímos na tabela atual, do sétimo lugar para baixo, pois todos abaixo dessa posição estão com aproveitamento menor que 50% (em apenas duas vezes o campeão estava com aproveitamento abaixo de 50% na 8ª rodada do brasileiro) e distantes seis pontos do líder (em apenas quatro vezes o campeão estava a seis ou mais pontos do líder na 8ª rodada do brasileiro). Corinthians, Grêmio e Botafogo fazem parte desse grupo e estão com um jogo a menos, o que poderia levá-los adiante na tabela, mas vou limitar e retirá-los com a ajuda do quesito aproveitamento.

A “lei de Guardiola” finaliza aqui, mas vamos com ponderações opinativas para limitar os favoritos.

Dos seis times que sobram, um é o completo intruso, pelo histórico recente e elenco disponível, que é o Vasco, e mesmo que termine bem classificado, o título seria uma zebra bem grande, apesar de estar com aproveitamento excelente, pois em onze dos quatorze campeonatos anteriores, o campeão tinha o mesmo aproveitamento ou pior quando da 8ª rodada. Portanto, estatisticamente falando, o Vasco não seria excluído, o faço com dor no coração de torcedor, mas tentando identificar que realmente o time não melhorou de anos anteriores para agora ao nível de ser candidato ao título. Entendo como menos favorito.

Outro que retiraria da lista é o São Paulo. E também muito pelo histórico recente. Está a apenas 03 pontos do líder na 3ª colocação por aproveitamento e vice-líder por pontos, mas ao olharmos com a lógica do futebol: elenco, time titular, situação do clube e resultados recentes, o São Paulo não é tão favorito quanto dois times que hoje figuram abaixo na classificação, Palmeiras e Flamengo. Está junto com o Vasco como menos favorito.

Limito, portanto, com a ajuda da “lei de Guardiola” e outros quesitos intangíveis, o campeonato brasileiro de 2020 a quatro favoritos após a 8ª rodada (essa limitação em apenas quatro times já na 8ª rodada me renderá um post bem polêmico no futuro – Pontos corridos x mata-mata):

Internacional (1º por pontos e 2º por aproveitamento), Atlético Mineiro (2º, 1º), Flamengo (5º e 6º) e Palmeiras (6º e 5º). Em se confirmando um desses quatro, acrescidos de São Paulo e vasco, a “lei de Guardiola” prevalecerá mais uma vez por aqui.

O Flamengo está hoje com a mesma pontuação que estava na 8ª rodada do ano passado, em que foi campeão.

Já o Palmeiras aparece com aproveitamento nesse ano melhor do que estava na 8ª rodada de 2018, em que também foi campeão.

Quanto à extrapolação de pontos que fiz na primeira tabela, serve para demonstrar o topo (líderes) e a base (rebaixados):

Existem oito times com aproveitamento para terminar o campeonato com menos de 45 pontos, e cinco times para mais de 70 pontos, e isso deve mudar.

A média de pontos do time campeão é de 77 pontos, e notadamente apenas dois times chegam perto dessa pontuação, então pelo menos três times podem piorar seu desempenho.

No quesito rebaixamento, a média de pontos do 16º colocado é de 43 pontos e do 17º colocado é de 42 pontos. Em apenas uma vez um time foi rebaixado com 45 pontos (Coritiba – 2009), e por isso fala-se tanto na tal nota de corte 45 pontos para evitar o rebaixamento. No entanto, nesse ano, tudo caminha para uma nota de corte menor, já que 16º e 17º colocados estão hoje com aproveitamento para 33 pontos ao final do campeonato, bem como os oito citados anteriormente com aproveitamento de pontuação abaixo de 45 pontos.

Dito isso, Fortaleza, Athlético, Coritiba, Atlético – GO, RB Bragantino e Goiás que se cuidem, pelo menos dois dos quatro rebaixados desse ano estão nessa lista.

E a tal “lei de Guardiola”, funciona?

Funciona, pero no mucho.

Há exceções à regra. No entanto, a lei ajuda a “filtrar” os candidatos ao título.

A interpretação do livro de Pep pode levar a infinitas considerações, mas o que entendo ser bom é a exclusão que é possível de ser feita mesmo estando no início do campeonato, mais precisamente na 8ª rodada. A lei ajuda a identificar que muitos times já estão fora da disputa. Nessa dinâmica, cinco ditos grandes clubes não são mais candidatos ao título: Santos, Fluminense, Corinthians, Grêmio e Botafogo, e quatro são bem mais favoritos: Internacional, Atlético Mineiro, Flamengo e Palmeiras, com dois intrusos menos cotados Vasco e São Paulo. O campeão pode não estar entre esses seis? Pode, mas será um evento bem fora da curva.

Prever o campeão é impossível, e o histórico demonstra isso, mas uma maratona como o campeonato brasileiro é comprovadamente ganha desde o seu início, principalmente nas oito primeiras e nas oito últimas rodadas, como bem escreve Pep Guardiola.

No meu entender, Pep extrapolou ao citar números exatos (quatro pontos do líder, 6ª colocação) como limitantes para os times que ainda estão na disputa pelo título.

Há de se ponderar que o campeonato brasileiro é diferente do europeu, não há estabilidade de treinadores e times montam e remontam seu elenco durante praticamente toda a competição, embaralhando as cartas a todo momento.

Mesmo assim, Guardiola se esquece que na estatística há sempre eventos fora da curva, e é justamente nesses dados que o torcedor cego e apaixonado se apega, acreditando que o Flamengo de 2009 ou o Palmeiras de 2018 podem ocorrer sempre.

Vinícius Perilo

Vinícius Perilo, 47 anos, é engenheiro civil apaixonado por todos os esportes. Tudo começou no Ursinho Misha em Moscou 80, e, a partir daí, acompanhando ídolos como Oscar, Hortência, Bernard, Jacqueline, Ricardo Prado, Joaquim Cruz. Ama futebol como todo brasileiro, faz parte da geração que chorou de tristeza a derrota de 82 e de alegria com o Tetra em 94. Realizou um sonho de criança e conduziu a Tocha Olímpica para a Rio 16. Ainda acredita no Brasil olímpico.

Artigos relacionados

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo
Send this to a friend