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Pesticidas e GMOs: menos histeria e mais ciência

Alimentar a humanidade é o maior desafio

Fala-se muito mal de pesticidas e transgênicos, mas se ignora a ciência. A culpa termina sendo das corporações malvadas, dentro de algum tipo de teoria de conspiração.

Esse tema termina sendo uma das Terras Planas da esquerda.

Outro dia, assisti a uma palestra de uma pessoa alegava que os pesticidas estão matando as pessoas por envenenamento lento e o que alimentos transgênicos são uma grande ameaça ao nosso futuro.

Após a palestra, eu confrontei a palestrante educadamente com argumentos. Ela não conseguir retrucar a altura e ficou desconcertada.

A relevância do aumento de risco depende do risco basal

Há muita desinformação do público leigo, no que tange a coisas prejudiciais à saúde.

Por exemplo, manchetes afirmam que ingerir embutidos (presuntos, salames, etc) aumenta o risco de câncer do estômago em cerca de 18%.

De fato, 18% é um número elevado e pode colocar muitas pessoas perto do pânico, ao olhar fatias de um delicioso salame.

As evidências dos males dos embutidos são fortes, mas é preciso lembrar que a incidência de câncer no estômago na população inteira é baixa (6.6 para 100.000). Assim 18% a mais eleva essa taxa para cerca de 7.8 para 100.000, ainda uma taxa bem baixa.


Risco é inerente à vida: cada um faz suas escolhas

Estando vivo, o risco de morrer nunca será nulo.

Se você comer menos carne vermelha, provavelmente sua expectativa de vida tende a ser um pouco maior.

Vale à pena? Essa é uma decisão individual.

Ou seja, não pretendo engolir toneladas de salames, mas não vou aboli-lo completamente da minha dieta por causa dos tais 18%.

Pesticidas não são a reencarnação do mal

A realidade é que agrotóxicos (nome pejorativo de pesticida) e transgênicos não são esses vilões como parte da mídia pinta.

Infelizmente, muitas pessoas desinformadas internalizaram esses preconceitos de uma forma muito entranhada.

Afinal, como muitos debates, essa, na verdade, não é uma questão política, mas meramente científica, para ser vista de forma objetiva e racional.

Brasil é zoado, mas não tanto.

Para começar, na prática, o cenário de resíduos de pesticidas em alimentos no Brasil termina não sendo pior que os outros países, desconsiderando a Europa.

Essa pesquisa é anterior ao governo Bolsonaro, mas mesmo em 2019 grande maioria das substâncias liberadas em 2019 usam princípios ativos já usados no Brasil.

Pesticidas estão aumentando a incidência de câncer?

A alegação principal (há outras, mas vou focar nisso) é que muitos pesticidas são cancerígenos.

De fato, a Europa é muito mais exigente que o resto do mundo em pesticidas. Estamos mais na linha dos EUA nesse campo.

Os pesquisadores dão doses cavalares para ratos e aí eles pegam câncer. Não dá necessariamente para estender esses resultados para seres humanos.

Excetuando câncer de intestino, provavelmente ligada a dietas de baixa qualidade e com poucas fibras; grande parte do crescimento de casos de câncer no mundo se deve ao crescimento da população e ao envelhecimento, e não ao consumo de pesticidas ou poluição de ar.

Para colocarmos isso a prova precisamos olhar estatísticas de incidência de câncer corrigidas pela questão da idade. Isso permite uma justa comparação entre diferentes países. Por exemplo, seria errado comparar o Brasil, onde as pessoas morrem cedo por diversos motivos, com a Europa em números absolutos.

Quando se examina um ranking que compara a incidência de câncer por 100.000 habitantes entre os países, de forma padronizada por idade, percebemos que, de fato, os EUA estão na frente da maioria dos países da Europa.

Só que é claro, para quem conhece minimamente o estilo de vida por lá, que isso se deve mais à obesidade, sedentarismo e hábitos alimentares medíocres. Os resíduos de pesticidas nos alimentos definitivamente não são o divisor de águas nessa questão.

O Brasil não está sequer entre os 50 países com maior incidência. A Itália, apontada pela excelência de sua dieta mediterrânea, está em 24º. lugar, situada em uma região com critérios mais rígidos para pesticidas e GMOs.

E o glifosato?

Em relação ao próprio glifosato, apontado como o grande vilão da Monsanto, essa ampla metapesquisa (pesquisa que compila muitas pesquisas) mostram que as evidências são algo contraditórias quando se refere ao câncer humano. O máximo que tem sido encontrado é um aumento discreto em alguns tipos raros de câncer.

A expectativa de vida só faz aumentar no mundo

Lógico que resíduos de pesticidas nos alimentos não são “legais”, mas se fizessem tão mal assim estaríamos todos lascados, inclusive nos países desenvolvidos. No entanto, o que se vê é o oposto. A expectativa de vida aumentou muito no mundo todo nas últimas décadas, apesar do aumento do uso de pesticidas e outros males.

Onde está o problema dos pesticidas?

O problema maior no Brasil, e em muitos países do mundo, não são os pesticidas nos alimentos em si, mas o uso dos pesticidas no campo devido ao manuseio inadequado, o que gera diversos envenenamentos e até câncer.

Ainda que os pesticidas nos alimentos não são desejáveis (pressionando-nos a lavá-los ou tirar a casca de certas frutas e legumes), esse é um problema sem solução fácil, porque é inviável achar que uma agricultura com menos pesticidas seria capaz de suprir a demanda global crescente por alimentos.

Agricultura orgânica seria a solução?

As pessoas pensam que a alternativa viável seria a adoção da agricultura orgânica, quando, na prática, isso jamais será capaz de alimentar os 7,5 bilhões de pessoas do mundo, um número que só faz crescer. Um artigo, publicado na Scientific American, desmistifica isso detalhadamente:

  1. A agricultura orgânica usa pesticidas, só que dentre os ditos “naturais”. Só que esses não são necessariamente mais brandos que os sintéticos. Natural e artificial é uma distinção apenas semântica. A substância química não sabe como ela “nasceu”. Por exemplo, o veneno do oleandro (figura acima) é tão forte que é possível morrer apenas comendo o mel de uma abelha que utilizou seu néctar como fonte.
  2. A comida orgânica não é mais saudável que a convencional, como o senso comum acredita. Para agravar, em países como o Brasil, nem se sabe se aquilo que é vendido como orgânico é de fato orgânico. Um dia visitei um alambique de cachaça orgânica no interior do Rio. Meu Deus! O fato é que a fiscalização aqui é simplesmente inoperante.
  3. A agricultura orgânica não é realmente melhor para o meio ambiente. Apesar de algumas práticas melhores de cultivo, há fatores que depõem contra ela, como baixa produtividade, o que exige áreas mais extensas, transporte em menores distâncias, mas por meios ineficientes,. Tanto que a galera do Freakonomics (eles adoram quebrar dogmas) levantou que a agricultura local (orgânica ou não), em média, deixa uma pegada de carbono total maior que a agricultura convencional. Óbvio que sendo orgânica, o problema se agrava.
  4. A agricultura orgânica é e sempre será voltada para pessoas de maior poder aquisitivo, inviável como solução global. É mais caro produzir, tem menor produtividade e escala, além de ser precificado como um produto premium. É como se fosse um sal do Himalaia disseminado.

Solução possível para o abuso de pesticidas? GMO!

Os GMOs é a sigla que significa genetically modified organisms, ou seja, correspondem aos organismos vivos (vegetais ou animais) geneticamente modificados, também conhecido por transgênicos.

A questão é que os alimentos transgênicos, que são tão condenados por certos grupos de pessoas, são, em geral, as mesmas pessoas que condenam os pesticidas e exaltam a agricultura orgânica. Inclusive, a agricultura orgânica bane o uso de GMOs, como uma de suas regras.

No entanto, os GMOs constituem justamente o único caminho viável para diminuir o uso de pesticidas na agricultura, sem impactar de forma significativa na produtividade.

Há problemas aqui e ali, mas visto de maneira abrangente, a adoção da tecnologia GMO reduziu em média o uso de pesticidas químicos em 37%, aumentou o rendimento das culturas em 22% e aumentou os lucros dos agricultores em 68%. Os ganhos de rendimento e as reduções de pesticidas são maiores nas culturas resistentes a insetos do que nas culturas tolerantes a herbicidas.

Como toda tecnologia, os transgênicos podem resultar em cases de sucesso ou fracasso e é preciso um processo sério de homologação.

Como um exemplo marcadamente positivo, veja o exemplo do golden rice, a tecnologia a serviço de salvar vidas nos países subdesenvolvidos.

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Em suma, existem resíduos de pesticidas nos alimentos? Sim. Eles fazem mal à saúde? Sim, raramente; crianças pequenas são mais suscetíveis, mas não da forma alarmista que muitos colocam. Eles seriam evitáveis de forma prática? Coletivamente não, infelizmente, mas existe um caminho de melhora via transgênicos.

Aliás, quem é contra os transgênicos jamais deveria tomar qualquer vacina contra a COVID-19: a vacina chinesa Coronavac ou a vacina da Oxford, por exemplo, nada mais são do que vírus modificados geneticamente.

Paulo Buchsbaum

Fui geofísico da Petrobras, depois fiz mestrado em Tecnologia na PUC-RJ, fui professor universitário da PUC e UFF, hoje sou consultor de negócios e já escrevi 3 livros: "Frases Geniais", "Do Bestial ao Genial" e um livro de administração: "Negócios S/A". Tenho o lance de exatas, mas me interesso e leio sobre quase tudo e tenho paixão por escrever, atirando em muitas direções.

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