Opinião

Eu luto, Tu luto, Ele(a) luto

Pera, calma… eu não errei a grafia do verbo lutar.

Nos últimos meses tenho pensado muito sobre como passamos por tantos lutos nessa vida, de diferentes tipos, perceptíveis ou não, e como cada um tem sua maneira de experimentá-lo. Como cada luto nos afeta de maneira distinta. Eu particularmente não gosto da expressão “viver o luto”. Não me faz sentido viver algo relacionado à morte.

Há poucos meses, passei pela experiência de despedir-me da minha mãe. Já havia perdido pessoas queridas próximas… tia, melhor amiga aos vinte e poucos anos, cunhado. Cada um numa história diferente. Uma numa doença degenerativa maldita, que tira um pouco da lucidez e vida a cada dia; a outra dias após um acidente; o outro repentinamente num acidente de moto.

Mas a experiência de perder a mãe é realmente algo único. Não só pela perda em si, pois mãe só tem uma, mas como recebemos as mais diversas formas de apoio e, eu diria, até cobrança pelos que nos cercam. É quase um experimento social.

É ligação que você não espera. Lágrimas em mensagens de áudio no WhatsApp. É a gente acalmando um amigo ou conhecido, não o contrário. Outros questionando a calma com que estamos experimentando o período (“Menina, se permita viver o luto, não precisa fazer tudo de uma vez”; “Como você consegue?”), sendo que muitas vezes essa é a nossa maneira de experimentar esse período. Uns se jogam de cabeça, outros entram em negação. Por outro lado, pessoas que você esperava estarem mais próximas e enviar mensagens mais longas, te ligar, simplesmente somem. Outras quase desconhecidas, com pouco contato, já encaminham mensagens lindas, que te fazem chorar.

Nesse período eu aprendi que não só “eu” estou experimentando o luto, mas cada um também tem sua maneira de experimentar e transmitir os sentimentos. De experimentar o luto. Seja pela própria personalidade, seja pelo que cada um já passou nessa vida e/ou está passando. E procurei respeitar cada manifestação e, até, cada cobrança… é, pasmem rsrs

Outro tipo de luto, o qual acredito que poucos notam, são as ‘mortes’ de pessoas vivas. Explico: quantas pessoas passaram na nossa vida, por um período curto, médio, longo, intenso, de contato, amizade e interação? E por motivos os mais diversos, simplesmente tomam uma outra direção, repentina ou não, e acabamos perdendo o contato. Esse tipo de luto pode ser quase imperceptível, silencioso, mas um dia olhando uma foto, lendo um texto, ouvindo uma música… cai a ficha. É, aquela relação acabou, foi-se, está enterrada, sepultada…

E finalmente, as redes sociais, a tecnologia hoje nos proporciona gratas surpresas. Conhecer pessoas que nunca teríamos a chance de conhecer, mas o Facebook e outras ferramentas nos conectam e, a partir daí, pode surgir uma amizade virtual. Por vezes com contatos e interações mais frequentes até do que daquelas amizades de infância.

Uma dessas pessoas que conheci virtualmente e nos apegamos foi o colega desse Papo de Boteco, o Victor Llebot.

É … A vida é realmente uma caixinha de surpresas.

Tão grata surpresa foi conhecê-lo virtualmente, seu humor, seu temperamento, suas ideias, tantos pontos em comum.

Tanto que nos identificávamos como gêmeos separados por mais de 10 anos de nascimento. Uma brincadeira nossa.

Tantas conversas que tivemos, onde ríamos, nos apoiávamos, fazia o meu dia ficar mais leve.

Agora a vida traz essa amarga surpresa … levou-o de repente, sem avisar, sem dar a chance de nos despedirmos e muito menos de nos conhecermos pessoalmente.

Você fará muita falta… mas levará esse seu humor único para onde quer que vá. Minhas melhores vibrações para sua passagem 🙏🏼

Fica aqui meu abraço virtual apertado para família, para a esposa Fabiana, e que encontrem apoio um no outro para passar por isso. E permitam-se cada um experimentar o seu luto, não importa como seja. Eu também ficarei aqui com o meu. Já as boas lembranças, essas serão eternas.

Anna Paula Más

Anna Paula Más, farmacêutica e bioquímica (USP-SP), fez carreira trabalhando quase 20 anos na área de pesquisa clínica e desenvolvimentos de novos medicamentos, focada na área ética e regulatória. Caixeira viajante (morou nos EUA, França e hoje fica entre Alemanha e Brasil). É extrovertida, social, costuma ‘unir’ turmas e pessoas de turmas diferentes. Dizem as más línguas que conversa até com o poste, adora palpitar, não tem receio de se posicionar e, por vezes, criar polêmicas. A pedidos, veio fazer parte do time Papo de Boteco com o propósito de trazer um olhar feminino, mas não por isso menos crítico, sobre assuntos diversos.

Artigos relacionados

6 Comentários

    1. Obrigada Celso pelas suas belas palavras.
      E, sim, cada um tem seu luto… diário, sofrido, duro, leve, e tantas outros adjetivos que possamos pensar.
      um grande abraço
      Anna

  1. Tocante.

    De fato, cada um vivência o luto de modo diferente. Há uns que inclusive necessitam postergar o luto, ao ver os outros familiares inconsoláveis e perdidos diante de morte repentina. Esses são os que vivem o luto tardio.

    Gostei em especial do que vc comentou sobre o luto pelas pessoas vivas. Interessante o ponto de vista.

    Por fim, vc me fez lembrar dos rituais “Antyesti” no hinduísmo, algo que recentemente tive a oportunidade de conhecer.

    Belo texto.

    1. Sim, com certeza, outra forma de luto. O tardio…
      E vou procurar essa sua menção sobre o hinduísmo, obrigada pela dica
      Obrigada por ler e pelo elogio ☺️

  2. Belo texto! O luto é de uma tremenda individualidade e as pessoas, por vezes, cobram comportamentos padronizados. O Victor LLebot transmitia uma grande vibração e sei que teria sido uma pessoa fantástica para conhecer pessoalmente. O mundo, de fato, não tem nada de justo…

  3. Obrigada Paulo… é bem por aí mesmo, a cobrança/expectativa de comportamentos padrões.
    Nem me fale, a vontade de conhecê-lo pessoalmente ficará realmente só na vontade.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo
%d blogueiros gostam disto:
Send this to a friend