Brasil: um caso a ser estudado
O Brasil é um caso a ser estudado.
Possui uma carga tributária de Alemanha, com boa parte dela incidindo sobre o consumo e onerando os mais pobres. A contrapartida dos impostos é oferecida em serviços públicos geralmente de baixa qualidade.
O BNDES, de orçamento multibilionário garantido pelo Fundo de Amparo ao trabalhador, proveniente de impostos cobrados das empresas, tem em seu histórico uma atuação voltada às grandes, a quem empresta a juros camaradas o que arrecada de todas.
O governo também recolhe o FGTS dos trabalhadores do setor formal; na prática ele morde parte do seu salário, deixa rendendo uma micharia e cria várias regras dificultando o acesso a ele. As empresas pagam impostos sobre esse valor e seus funcionários não veem a cor do dinheiro. O mais engraçado é que a engrenagem é vista como um “direito do trabalhador”. É como se você agradecesse a um sócio oculto que toma 9% do seu salário e não lhe dá nada em troca por isso. Impressionante.
Como grande gerador de desigualdades, o estado brasileiro patrocina aposentadorias milionárias a uma ínfima parcela da população, além da garantia de estabilidade, faça chuva ou faça sol, à toda casta de funcionários públicos. Isso obviamente tem um custo, que somado consome grande parte do orçamento, impedindo qualquer flexibilidade razoável para investimento…
Não surpreende também que sejamos um dos países comercialmente mais fechados do mundo, com gordos impostos de importação incidindo sobre todos os tipos de produto, inviabilizando o acesso dos brasileiros a bens e serviços mais baratos e mimando uma indústria nacional pouco competitiva.
Esse cenário não é de hoje. Foi construído ao longo de muitas décadas e está tão enraizado em nossa cultura que já perdemos a capacidade de questioná-lo. Governos entram, saem e a realidade segue a mesma, inabalável.
Uma parte desprezível desse orçamento é canalizada para programas sociais como Bolsa Familia ou similares, e esse mesmo governo que meteu a mão no seu bolso sem dó é exaltado por sua preocupação social. Não deixa de ser incrível.
E cá estamos nós observando mais um aumento de imposto, supostamente temporário, para garantir um complemento ao Bolsa Família. Nada contra o programa, que só existe pelo fracasso do estado em prover condições mínimas de geração de renda aos cidadãos, mas a prática é mesma de sempre. Aumentem-se os impostos que está tudo resolvido…
Não por acaso, mas por mérito, seguimos nossa trajetória de “andar de lado”, enxugando gelo e fazendo aquele esforço sobre humano para não sair do lugar. O mais desanimador é que não há sinais de mudança no horizonte.
O Brasil merece ser estudado!
Dentre tantas facetas que se apresentam em todos os campos torna-se muito difícil descobrir por onde começar.
De meu tempo de executivo, lembro-me da espinha de peixe (Ishikawa) para encontrarmos a causa-raiz de um problema. No caso de nosso país, seriam algumas causas e não apenas uma.
Penso que uma delas é nossa cultura de evitar o confronto. Isso faz com que as questões sejam analisadas de maneira superficial. Paradoxalmente, somos mestres em discutirmos as divergências e nunca o espaço-comum. Assim, quase nunca produzimos soluções de compromisso para a otimização de nosso processo enquanto nação.
Facilitamos, enquanto maioria silenciosa e massa de manobra política, a concertação entre os detentores do poder econômico que, por sua vez, mantém nossos legisladores servis.
Vem dessa concertação, a certeza da impunidade que provoca a inércia na mudança do status-quo e, ao mesmo tempo, o agravamento das diferenças.
Para estabelecer uma situação atual e interessante. A questão dos precatórios. À exceção daqueles cujo negócio é baseado na arbitragem dos precatórios e, portanto, dependem do cumprimento das obrigações, todo o restante do país assiste à essa discussão com absoluta normalidade. E aceitaremos alguma decisão que favoreça a União.
Ocorre que os precatórios são apenas uma consequência de malfeitos anteriores. Eles existem porque o Judiciário entendeu que, em algum momento do passado, alguma regra foi infringida e uma parte mais frágil sofreu perdas financeiras impostas por agentes do poder.
Nessa ótica, boa parte do problema orçamentário do próximo ano está no “pendura” feito há muitos anos por outros governantes. Desde sempre, não é uma questão ideológica! Políticos de todos os matizes usam e abusam de decisões onde o gasto é imediato e o pagamento será quando Deus der bom tempo.
Quem pode interromper essa narrativa dentro de uma democracia? O Congresso Nacional, as Assembleias Estaduais e Municipais. Não existe outra saída.
Dos problemas citados no texto todos necessitaram, em algum momento, da aprovação de uma Câmara. A visão dos legisladores – quase sempre turva por interesses paroquiais ou pessoais – impede a discussão séria do encaminhamento das melhores decisões para o País.
Votar melhor! Convencer a cada dia um eleitor a comprometer-se com estudar os candidatos é mandatório. Fazer com que cada um de nós perceba o poder do voto e faça ações pertinentes para preservá-lo é um caminho.
Quando nosso Congresso estiver mais aparelhado para entender que confrontar ideias não é a mesma coisa que polarizar, estaremos num melhor ambiente para estudar nosso país.