Sobre seres do esgoto e as fronteiras éticas da Inteligência artificial
A polêmica gerada pelo desprezível Kanye West e o vídeo de desagravo

Entre as tretas globais da semana, uma viralizou e gerou debates polêmicos em duas frentes.
Um rapper chamado Kanye West, que eu ouvi falar pela primeira vez há pouco tempo por ocasião da apresentação com roupa transparente de sua mulher em um desses eventos artísticos, andou fazendo marketing de uma camiseta com a suástica , afirmando, entre outras coisas odiar os judeus e admirar os nazistas.
Trata-se de mais novo exemplar de idiota ao melhor estilo “chickens for KFC’, uma vez que sob a tutela de um Hitler, o próprio rapper, preto, seria cremado vivo junto com os judeus. Um sujeito que endossa ódio a alguém por sua etnia, cor, raça ou qualquer característica afim pode ser classificado como escória da humanidade, um pária que merece nada mais do que o nosso desprezo ou na melhor das hipóteses o ostracismo. Mas nesse mundo estranho em que vivemos, esse imbecil tem 30 milhões de seguidores. E para anunciantes, isso pode ter lá o seu valor. Inclusive, o fato do sujeito estar na mídia, mesmo pelas razões erradas, talvez até aumente seus “honorários” de.mercado, é o famoso ‘falem mal, mas falem de mim”.
E no mundo onde “clicks”, “likes” e “seguidores” se impõem como fortalezas comerciais, mesmo um pária como esse vindo do esgoto pode prosperar e ser considerado uma pessoa de sucesso. Trata-se de um efeito colateral danoso da realidade das mídias sociais, a visibilidade está ao alcance de todos, mesmo aqueles desprovidos de princípios competências ou habilidades extraordinárias. Se por um lado, essa situação democratizou o acesso à fama, por outro nos trouxe o desprazer de sermos surpreendidos por gente dessa laia sendo notícia por aí.
Muito bem, houve uma reação ao episódio acima. Circulou um vídeo, gerado por IA, onde vários artistas (aparentemente de ascendência judaica) vestem uma camiseta com a figura do dedo médio em riste para o tal Kanye. Algo do tipo “vá se F…, Kanie West”. Como toda boa produção de IA, o vídeo é perfeito, parece realmente real e fruto de uma campanha organizada. Não foi o caso.
Uma das atrizes que aparecem na peça, Scarlett Johansson, manifestou-se contrária à publicação de algo sem autorização das pessoas envolvidas. No limite, segundo ela, não saberíamos mais distinguir a verdade da mentira, levando-nos a uma situação bastante perigosa. Dada a qualidade técnica das produções de IA, teríamos as ‘fake news exponencializadas” à máxima potência. No meu entendimento, Scarlett está correta. Uma causa justa não justifica o uso de “falsidade ideológica”, mesmo por que, como sabemos, a’ justiça da causa’ é algo subjetivo, por mais que nesse caso seja o óbvio ululante.
Com o aprimoramento técnico da IA, está se tornando cada vez mais difícil distinguir um vídeo real de um “artificial”, estou antevendo o nível de “sujeira” que pode aparecer nas próximas eleições, para ficar em um exemplo básico. Mas a questão aqui é mais profunda, trata-se da proteção da integridade das pessoas, um vídeo fake tem poder difamatório quase “inapagável” em tempos onde a atenção a um assunto dura poucos minutos. Teríamos o efeito de una notícia bombástica na manchete de um jornal em um dia, com a nota de “erramos” em letras minúsculas no rodapé de uma página perdida na sequência.
Enquanto os vídeos de IA dão vida a estátuas, personagens históricos e quadros famosos, tudo bem. Quando as fronteiras da ética começarem a ser ultrapassadas, a coisa pode sair do controle.
O exemplo do vídeo em desagravo a Kanye West, por mais que tenha nos causado simpatia pelo combate a um “ser do esgoto”, ultrapassa esses limites. Houvesse um acordo com os personagens do filme, sem problemas, mas aparentemente foi feito à sua revelia. Não é somente sobre direitos de imagem, mas sim sobre a “veracidade” da informação.
Enfim, tempos difíceis., pautas complexas. A certeza que eu tenho desse episódio é que personagens como Kanye West não deveriam sair do pântano moral em que vivem… E o mundo não deveria dar visibilidade a tipos como esse. De minha parte, foi a primeira e última vez que eu o trago para a “ribalta”.
Deep Fake, é como se chama este tipo de video gerado por IA.
E, pode escrever: será usado e abusado nas propagandas eleitorais daqui por diante…
Victor,
Excelente texto reflexivo. É um absurdo, para mim, que um sujeito saia por aí defendendo o nazismo e o ódio. E indo para o ralo, ainda tem-se um vídeo criado por IA mostrando participações de personagens que não sabiam dele. No fundo seu texto traz, novamente, além do da discriminação, a questão se as redes e penduricalhos digitais precisam de regras ou não ? É grave . Um cara com trinta milhões de seguidores defender algo nefasto como o nazismo e o ódio aos judeus. Isso é liberdade de expressão ? Complexo e complicado!
Excelente reflexão.