Allan Kardec, o cientista que explicou o cristianismo – Artigo 4

Médiuns espíritas conseguem prever o futuro?
O fenômeno da “mediunidade” pode ser descrito, de forma muito simplificada, como a capacidade que algumas pessoas têm de comunicar-se com os “espíritos” desencarnados.
Em princípio, toda e qualquer pessoa possui esta capacidade mas, como ocorre com outros dons humanos, alguns a tem mais desenvolvida. Numa comparação bem simples, podemos dizer que todo mundo consegue cantar, mas pouquíssimos poderão chegar ao nível de um Frank Sinatra ou Milton Nascimento. Todo mundo pode, de alguma forma, comunicar-se com os espíritos, mas Chico Xavier ou Divaldo Franco estão em outro patamar.
Seriam então os médiuns seres especiais, escolhidos por Deus, pessoas acima do comum dos mortais? Certamente não é assim que as coisas acontecem. Na visão da doutrina espírita não existem pessoas “diferentes”, todos somos espíritos em busca de aperfeiçoamento. E o dom da mediunidade pode fazer parte do “pacote” reencarnatório de alguns seres humanos. Conforme deixamos claro nos artigos anteriores, cada reencarnação é uma oportunidade de expiação de erros pretéritos e de melhoria espiritual. Sendo assim, nosso corpo físico pode trazer marcas do passado, normalmente sob a forma de limitações ou aptidões físicas, intelectuais, artísticas ou quaisquer outras. A mediunidade “acima da média” pode ser uma destas características. Como expiação ou missão ou as duas coisas. Não nos cabe interpretar.
Chico Xavier dizia que a mediunidade era um peso. Analisando a sua trajetória, não é difícil entender que a passagem dele por esta Terra foi de sacrifício constante, visando o cumprimento de uma missão que ele entendeu como poucos. O dom que recebeu foi desenvolvido a custa de muito trabalho. Vale lembrar uma passagem em que Emmanuel, o mentor espiritual de Chico, diz a ele que um médium precisava de três coisas; disciplina, disciplina e mais disciplina. Consciente de sua tarefa, Chico abriu mão de prazeres e riqueza material, dedicando-se a produzir uma obra monumental, com ensinamentos que serviram de guia e consolo para milhões de leitores. Acredito que tenha sido bem sucedido na tarefa, mas, como digo sempre, não nos cabe julgar. Porque tocou a ele fazer isto, é assunto que também não nos diz respeito, não estamos aqui para fazer fofoca espiritual. Chico completou sua obra sem cair em tentações mundanas, e é isto o que realmente importa.
Também é importante esclarecer que, muitas vezes, a mediunidade fora de controle pode ser confundida com doenças mentais, como esquizofrenia e outras. O menino personagem do filme “O Sexto Sentido”, que via pessoas mortas, pode ser um exemplo de médium ainda sem controle. Sobre o assunto, Divaldo Franco conta uma história deliciosa; desde criança ele tinha esta “facilidade” de ver pessoas desencarnadas com a mesma nitidez com que via os encarnados. Na juventude, quando começou a trabalhar em uma repartição pública, isto se tornou um problema, porque muitas vezes ele “via” no balcão pessoas “mortas” e erguia-se da sua mesa para atendê-las. A solução foi confessar a situação para uma colega de trabalho, que acreditou nele, de forma que os dois estabeleceram um código; toda a vez que Divaldo via alguém no balcão, perguntava para ela; “É real?”. Caso confirmado, ele ia atender. Ao longo do caminho, com muita disciplina, ele aprendeu a “domar” esta mediunidade para usá-la de forma correta.
Enfim, descrever as situações que um médium pode passar exigiria um livro inteiro, valendo dizer que este livro já existe, é o “Livro dos Médiuns”, escrito pelo próprio Kardec. De qualquer forma, o que precisa ficar claro é que a mediunidade é um fenômeno físico, onde, de alguma forma, a energia do médium consegue manter contato com a energia dos desencarnados. Isto pode se manifestar de várias maneiras diferentes, desde a simples intuição (onde o espírito consegue influenciar o raciocínio do médium), passando pela psicografia (onde as mãos do médium escrevem sob o comando dos espíritos, como no caso de Chico Xavier), indo até os chamados “médiuns de cura”, através dos quais os espíritos podem até fazer cirurgias. Não pretendo escrever aqui um tratado sobre o assunto, o “Livro dos Médiuns” faz isto de forma extremamente didática. Também não vou negar que existem charlatães e enganadores, tanto na doutrina espírita como em qualquer outra. Ninguém é melhor do que ninguém.
Neste ponto há uma questão interessante; muitas pessoas entendem que médiuns poderiam, então, prever o futuro. Afinal, em princípio, todos nós temos um destino traçado nesta vida, e é de se supor que os espíritos desencarnados conheçam este destino. Ora, alguém que está “em contato com espíritos” poderia ser bastante útil nos esclarecendo e auxiliando na sempre difícil tomada de decisões.
Este raciocínio pode parecer obvio, mas convém alertar para várias pedras de tropeço que podem estar escondidas no caminho.
A primeira delas diz respeito ao livre arbítrio. Todos temos uma espécie de “rascunho” de biografia quando reencarnamos, que podemos seguir ou não. Nossas ações e escolhas ficarão sempre sob nossa responsabilidade. “A dúvida é o preço da pureza, e é inútil ter certeza”, já dizia um inspirado Humberto Gessinger (o “Engenheiro do Havaí”, para quem não está ligando o nome à pessoa). Seria muito fácil ter todas as decisões prontas, e é necessária a dúvida para que possamos evoluir. Imaginem o que um estudante iria aprender se todos os exames já viessem com as respostas certas anexadas. E, no caso da vida real, nem sempre podemos dizer que há uma resposta “certa”. O importante é sempre tomar decisões pautado no amor ao próximo e com a perspectiva da evolução espiritual. Resumindo, se Deus não nos deu o dom de prever o futuro, é porque Ele confia em nós o suficiente para saber que vamos tomar as melhores decisões. E, quando não for o caso, vamos aprender com os erros. Assim, consultar um “médium” para ajudar a escolher quem vamos namorar entre possíveis candidatos(as) não é exatamente um procedimento recomendável. Mas, enfim, cada um é dono da sua vida.
O segundo ponto é a confiabilidade do médium. Já foi dito aqui que a mediunidade é uma troca de energias entre “vivos” e “mortos”. Ora, não é difícil entender que alguém que usa a mediunidade para aconselhar pessoas sobre assuntos mundanos (e, pior ainda, se propõe a ganhar dinheiro desta forma) corre um sério risco de entrar em contato com espíritos que vibram em uma energia não muito iluminada, para dizer o mínimo. É claro que não nos compete julgar as ações dos outros, mas o fato é que a busca por este tipo de aconselhamento, muitas vezes, pode levar a situações desagradáveis. Muitos autores de várias religiões recomendam que, quando a pessoa está em dúvida sobre como proceder, se recolha em oração e busque uma leitura inspiradora, que pode ser o texto bíblico ou qualquer outro. Entregar as nossas decisões a pessoas que se dizem capazes de prever o futuro pode ser um mau caminho. Mas, repito sempre, cada um é juiz de seu destino.
No fim das contas, talvez a frase mais sábia sobre o assunto seja aquela das nossas vovós; o futuro a Deus pertence. Complementando com o trecho da inspirada carta de Paulo aos Coríntios, “mesmo que me fosse dado o dom das profecias (…) sem amor eu nada seria”. É preferível confiar em nossa intuição, nos nossos mentores espirituais e buscar em nós mesmos as soluções. Ah, e se der errado? É porque era prá ser assim mesmo. Lembrando sempre que, muitas vezes, o que parece “dar errado” num primeiro momento, pode vir a se provar como o melhor caminho, depois de algum tempo. Eu mesmo tenho uma boa história de vida para contar sobre este assunto, mas este texto já ficou longo demais. Depois eu conto.
Até o próximo artigo.
Hervé,
Agradeço seu texto, que nas entrelinhas, traz boas energias e inspira-nos a seguir com esperança, mas volto a realçar, e sem julgar o Espiritismo ou outras religiões, mas fico com dúvida sobre o destino já definido para ser cumprido, que não me parece livre-arbírio. Minha ignorância não consegue entender as guerras, que não são de hoje, onde morrem crianças e pessoas inocentes sequestradas, por exemplo. Será que não existem froças maiores que não possam intervir ? Será que Deus nos abandonou ? Como diz a música dos Engenheiros do Hawai:
“Quem ocupa o trono tem culpa
Quem oculta o crime também
Quem duvida da vida tem culpa
Quem evita a dúvida também tem”
Não é simples.
Fique bem e obrigado pelo texto.
Marcio,
não nos conhecemos (conheço o Victor) mas acho que você iria gostar de saber uma história sobre o tema que aconteceu comigo. Sou católica (nem tão praticante assim) e nunca dei bola para as outras religiões. Acho que nem acreditava muito em espiritismo até esse dia…
Eu tinha uns 17 anos. Fazia escola técnica em Recife. Depois da aula ia para o estágio. Almoçava minha marmita no escritório e, nesse horário, nunca tinha ninguém lá porque todos saíam para fazer suas 2 horas de almoço.
Estava na sala em que em trabalhava. Imagina aquele escritório antigo, com salas fechadas. Comecei a comer e chegou o dono, um senhor sério, professor de universidade, super profissional e pessoa maravilhosa. Veio me dar tchau, dizer que estava indo almoçar. Falamos de amenidades e ele fechou a porta. E voltou. Disse ‘tem alguém que gosta muito de você e está ao seu lado lhe fazendo companhia’. Eu sabia que ele era médium mas não pensei jamais que viveria uma experiência assim com ele. Também sabia que ele não diria isso se realmente não tivesse visto o que viu. Não brincaria com algo assim. Fiquei sem reação. Até com medo. Não consegui perguntar nem quem estava ao meu lado (apesar de ter uma suspeita). Mas, nesse dia, entendi que a mediunidade existe.
Gostei do seu texto e depois lerei os outros. Acabo me esquecendo de ler os textos de vocês mas normalmente quando o faço, curto.
Boa escrita!
Carol, desculpe, só hoje vi seu comentário. Grato pelas palavras. Realmente, a mediunidade é um fenômeno normal, apenas as suas leis ainda são objeto de discussão. Muito legal a sua experiência. Abraço virtual