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Românticos de doer

Um Top10 fazendo coraçãozinho com as mãos

Quando era crítico de cinema, o hoje cineasta Kleber Mendonça Filho, escreveu, talvez, a melhor resenha que já li, do filme de Hong-Kong Amor à Flor da Pele (In the Mood for Love), sobre homem e mulher que tecem entre si uma relação sublimemente platônica. Kleber resumia em três palavras a obra-prima de Wong Kar-Wai: “romântica de doer”, uma daquelas expressões que a gente acaba adotando para a vida, né, como “inefável”! Tanto que no final dos anos 2000, criei, no meu falecido blog, um ranking “Top10” – entre filmes daquela década – dos casais de personagens “românticos de doer”. Além do par sem nome de Amor à Flor da Pele, a lista eclética incluía os inefáveis (olha aí!) Joel e Clementine, de Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças; a química de Jesse e Celine caminhando por Paris, em Antes do Pôr do Sol; nada menos que três casais da comédia multienredo Simplesmente Amor (Love Actually) (incluindo o fofo padrinho que revela com cartazes que acha a noiva do amigo perfeita); e até os pares, digamos, extra-humanos, mas não menos sentimentais, Wall-E e Eve (de Wall-E) e Kong e Ann Darrow (de King Kong (2005))!

Pois bem, agora acontece que, de 2010 a 2019, penso que assisti a menos filmes de amor. Sequer lembro de cabeça alguma comédia romântica desse decênio! Será que eu consigo criar um novo Top10 de casais românticos de doer?

Antes de tudo, o que se entende por essa expressão? Acho que cada um pode ter sua própria significação. Pra mim, esse tipo de romantismo não é aquele ultrassentimentalismo trágico, como no perturbador Amour ou no simpático e tocante A Culpa é das Estrelas. Na minha concepção, até pode conter esses elementos (e incluí, por exemplo o contagiante Nasce uma Estrela), desde que o foco seja no amor como uma pequena melancolia, um bichinho que rói por dentro; uma melodia composta a dois sem refrão; uma friendzone desanimadora mas de onde não queremos sair; uma comichão sensual; um amor saudoso, ou não correspondido, ou irrealizável, ou até mesmo em doce decadência. Pra mim, “romantismo de doer” reside nas acepções de solitude ou de saudade. Um troço dorido e prazeroso; um bicho de pé que nos consome, mas que cultivamos com afeto.

Por isso, minha lista da última década é encabeçada pelo maravilhoso par de Me Chame pelo Seu Nome, de 2017. Nada trágico ocorre nesse charmoso romance proibido de verão, mas nem por isso a gente deixa de se emocionar intensamente como se fôssemos nós o jovem do longa, experimentando sofregamente o primeiro amor e a primeira sofrência. Tenho dito que é o melhor filme romântico desde As Pontes de Madison (1995), marco no gênero. A cena da conversa entre pai e filho já é, pra mim, um dos melhores diálogos do cinema.

Além dele, pincei casais simplesmente lindos (La La Land, Se a Rua Beale Falasse, Nasce uma Estrela), outros trabalhados na nostalgia (La La Land, A Forma da Água), uns em que “tá difícil” de se encontrarem (Medianeras, Your Name, Mary e Max), um que enfrenta forte preconceito (Se a Rua Beale Falasse), aquele, sim, de chorar (Nasce uma Estrela), um com erotismo à flor da pele (Azul é a Cor Mais Quente) e uns 100% platônicos e solitários (Mary e Max, Ela).

Assim como no ranking anterior, há também casais que fogem ao padrão, digamos, humano: os de Ela (homem + sistema operacional) e de A Forma da Água (mulher + criatura anfíbio-hominídea). E, apesar de eu ter falhado em assistir a muita coisa asiática, como produções da recente onda coreana, não podemos esquecer deles que costumam ser os mestres dos amores irrealizáveis: os orientais. Se Hong-Kong havia nos dado Amor à Flor da Pele na década anterior, agora os japoneses se fizeram presentes com o jovem casal separado por um continuum de tempo, espaço e alma, no anime Your Name. No bom sentido: é de doer!

Segue o ranking (as datas são das estreias no Brasil):

Top10 Pares Românticos de Doer (Cinema do Anos 2010)

  1. Elio & Oliver (Me Chame Pelo Seu Nome – 2018)
  2. Theodore & Samantha (Ela (Her) – 2014)
  3. Mitsuha & Taki (Your Name (Kimi no Na Wa) – 2017)
  4. Mia & Sebastian (La La Land – 2017)
  5. Mariana & Martin (Medianeras – 2011)
  6. Tish & Fonny (Se A Rua Beale Falasse – 2019)
  7. Adèle & Emma (Azul é a Cor Mais Quente (La Vie d’Adèle) – 2013)
  8. Ally & Jackson (Nasce uma Estrela – 2018)
  9. Mary & Max (Mary e Max – 2010)
  10. Elisa & Criatura (A Forma da Água – 2018)

E vocês, assistiram a esses filmes? Amam? Odeiam? Esqueci algum casal?

Vladimir Batista

Vladimir Batista é escritor, professor e cinéfilo. Após 25 anos trabalhando como engenheiro em multinacionais de tecnologia, resolveu abraçar sua paixão de infância pelas palavras e por contar histórias e segue carreira na área de Letras e Literatura. Gosta de filmes e livros de gêneros variados, atendeu a vários cursos e oficinas de roteiros de cinema, de série e de técnicas de romance e tem um livro publicado pela Amazon: “O Amor na Nuvem De Magalhães”. Vladimir é casado, vegetariano e “pai” de cachorros resgatados.

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2 Comentários

  1. Legal , Vladimir!
    Me lembro do “500 Days with Summer”, “Um Dia” com a Anne Hathaway, “Juliet, Nua e Crua”, com o Ethan Hawke

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