Opinião

Como ser “não polarizado” te causa problemas

Tenho frequentado pouco as redes sociais principalmente pela falta de racionalidade que tem imperado ultimamente.

Mas na semana passada fiz um post com uma foto de uma manifestação de belgas contra a o passe sanit´ário e, por tabela, a vacinação obrigatória. Meu comentário se restringia a falar que essa situação não está restrita ao Brasil e que era global.

Não é a primeira vez que posto algo com esse tipo de mensagem. O brasileiro tem mania de achar que tudo é exclusividade do Brasil, tudo são “jabuticabas”. Invariavelmente minha mensagem é no sentido de aliviar a culpa coletiva por nos acharmos “diferentes” e mostrar que há um mundo em volta. Vivendo em um país pequeno como Portugal, noto que talvez isso esteja relacionado ao tamanho do país, mas aí já é outro assunto.

Mas retomando, nesse caso, por tocar em um tema “delicado” recebi um comentário dos mais sem sentido que poderia receber:

“Você é a favor do Bolsonaro?”

No primeiro momento não consegui conter a risada. O que falar sobre o fato do brasileiro não perceber o mundo citando a Bélgica como exemplo, tem a ver com Bolsonaro?

Respondi informando que não havia menção ao presidente no post, inclusive o tema era uma passeata belga, o que me foi rapidamente rebatido com coisas do tipo “ainda bem, pois ele é um verme!”.

Novamente ri. O que falar para alguém que tem apenas uma coisa na sua mente?

Essa fixação é tão cômica quanto triste. As pessoas pararam de raciocinar e perceber que há vida para além de Brasília e seus postulantes. Tudo agora gira em torno da cadeira presidencial. Eu diria que quem senta ali desperta mais interesse nas suas ações do que a Rainha da Inglaterra para os ingleses.

E foi nessa hora que tive um “insight“: sou um “não polarizado”.

Notei que não era capaz de xingar o Bolsonaro naquele contexto, mesmo que quisesse. Não fazia sentido.

Disclaimer
Antes de continuar, para aqueles que quiserem saber, meu viés político é de centro direita, não acredito nos milagres sociais da esquerda, muito menos na lei da selva do liberalismo total, mas quero um estado menor, cuidando do que interessa, provendo serviços básicos de qualidade, impostos menores para incentivar a atividade econômica e ações sociais para combater desigualdades e dar suporte a quem tem menos oportunidades, mas sem assistencialismos que gerem dependência.

Ser um não polarizado, portanto, não é não ter uma posição política definida, um neutro ou um “nem nem”, é separar os temas e perceber que muitas discussões excedem nossos governantes e países, que é importante ouvir diversos lados de uma mesma questão e então procurar chegar a uma conclusão.

Sob um certo ponto de vista, ele está alinhado com o capítulo “O instinto de perspectiva única”, do livro Fact Fulness, onde o autor explica a tendência, e o conforto, do ser humano em buscar uma verdade e seguí-la, simplesmente porque é mais fácil.

Ser um não polarizado nunca foi fácil, e ultimamente está muito mais difícil, mas é o que nos dá uma sensação de estar minimamente no controle das nossas ações e de perceber que a grande maioria das situações esdrúxulas que vemos no nosso dia a dia são um comportamento típico do ser humano enquanto espécie.

Não estou negando aqui as influências sociais, regionais e familiares de cada um dos indivíduos, mas enfatizando exatamente o fato de serem indivíduos e que, afinal, não somos assim tão diferentes uns dos outros.

Recentemente conheci uma série na Netflix chama Lilyhammer, que narra as aventuras de um mafioso italiano de Nova Iorque que decide se esconder na pequena cidade de Lillehammer na Noruega. É hilariante assistir a desconstrução da “sociedade perfeita” que enxergamos de fora. A série conta com a participação de noruegueses e é falada parcialmente em norueguês.

Quero com isso ilustrar que, mesmo em uma sociedade considerada perfeita por tantos, é possível mostrar muitas coisas erradas, incluindo tráfico de bebidas, um profissional de “integração de imigrantes” mais preocupado em arrumar mulheres, racismo, golpes, etc.

Vejo muita gente que eu considerava polarizando por qualquer coisa, e sendo do Brasil invariavelmente culpando o atual ocupante da cadeira presidencial por qualquer coisa. Muitos eu, infelizmente, tirei do meu círculo das redes sociais. era péssimo entrar na minha time line e ver posts e mais posts xingando A ou B. Além disso, todas as vezes em que eu lhes pedia ou apresentava fatos, virava alvo de ofensas.

Quanto à pessoa que chamou o Bolsonaro de verme no meu post sobre a Bélgica, eu respondi que não o acho um verme (na verdade penso que ele é um bronco mesmo).

Acho que perdi mais um amigo, mas me manterei sem polarizar.

Muitos não vão concordar comigo, a maioria me chamará de “isentão”, mas uma coisa eu afirmo: está aí algo que eu realmente não sou.

Emanuel Alexandre Tavares

Matemático, apaixonado por tecnologia, dados e BI. Leio muito e analiso tudo o que passa por mim. Sempre levanto dúvidas e avalio a fonte. Hoje moro em Lisboa, estava precisando de um pouco mais de qualidade de vida.

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Um Comentário

  1. Eu sou filiado ao Partido Novo e alguns colegas de partido, de zoeira, falam que sou o mais esquerdista dos liberais.
    Frequentemente fui chamado de isentão nas redes sociais.
    A polarização é a expressão da falta de conhecimento, de empatia e de capacidade cognitiva.

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