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Brasil 2022: entre a cruz e a espada

No Brasil de 2022 tudo indica que estaremos na situação descrita pelo título, tomando emprestado uma expressão empregada no tempo das cruzadas.

De um lado temos a tosquice raiz do Bolsonaro, que gera uma imagem externa e interna péssima, exceto entre seus apoiadores, para quem todos os demais mortais são “comunistas” e inimigos.

E a imagem do governante gera muitos efeitos práticos, como se sabe, somado ao crescente endividamento do país.

Dentre outras coisas, estamos com um nível de confiança ainda baixo (embora esteja se recuperando, ainda não alcançando níveis pré-pandemia) , que afeta diretamente as perspectivas econômicas, uma elevação importante na taxa de juros, crescimento significativo do risco Brasil, e baixa percepção de estabilidade (que influencia de forma significativa decisões de investimentos, embora o Brasil em 2021 tem perspectivas   de pelo menos voltar ao nível de 2019 em IED – Investimentos Estrangeiros Diretos), além de uma importante alta no câmbio, nos combustíveis e em vários alimentos, que desaguam em mais inflação.

Em termos de imagem, por exemplo, a grande maioria dos jornalistas, já não gostava do Lula, especialmente a partir da crise de 2008, e o criticavam incansavelmente, mas dentro dos ditames de um jornalismo razoavelmente equilibrado.

Por outro lado, Bolsonaro, ainda como candidato, declarou guerra ao grande jornalismo (aqui, ali etc), o que terminou gerando um ódio quase físico dos jornalistas pelo mito.

Assim a grande maioria dos jornalistas adotaram um tom parcial e exagerado, deixando qualquer tentativa de isenção de lado, embora muitas das críticas sejam justas em sua essência, mas terminam perdendo a credibilidade pelo exagero e falta de foco. Os jornalistas hoje enquadram até um espirro do Bolso como grave.

No entanto, quem imputa a responsabilidade apenas ao comportamento da imprensa em relação ao governo Bolsonaro, esquece que toda guerra tem dois lados.

Tivesse o Bolsonaro, ainda candidato, assumido uma postura mais conciliatória (o que lhe é impossível) não teríamos assistido esse jornalismo, que ao invés de ser combativo, torna-se rancoroso.

O mesmo vale para o STF. Ainda que o STF mais do que mereça muito das críticas, o STF e alguns de seus membros foram repetidamente xingados pelos Bolsonaro e apoiadores, o que levou a muitos ministros esqueceram os compêndios de Direito e se excederem nas suas decisões. Tanto que desde a redemocratização nunca assistimos um STF tão invasivo, desrespeitoso às leis e fora de seus limites constitucionais.

Quisera eu que o Temer tivesse escrito aquela carta no início do governo Bolsonaro, que agora tenta engatar, com falhas, a tal postura “paz e amor”, para se contrapor ao Lula, que também virá de “paz e amor”, para tentar acalmar o empresariado.

E agora (ontem a bolsa despencou) assistimos novamente tintas de populismo no chamado Auxílio Brasil, a ser deflagrado em ano eleitoral, com macetes engatilhados para burlar o teto de gastos, uma das boas heranças de Temer e da lei de Responsabilidade Fiscal, que é uma das heranças pródigas do FHC.

E ainda habitam as redes sociais vários bolsonaristas se contorcendo para encontrar exemplos mundiais de inflação e carestia (que sempre existirão), esquecendo que, do ponto de vista estatístico o Brasil está entre os piores dentre os maiores países nesses quesitos.

Esse tipo de defesa lembra muito os fanáticos petistas que atribuíram à ausente crise internacional, a culpa pela recessão no Brasil em 2015/2016.

✱✱✱

De outro lado, temos a tosquice chique e acadêmica (não pelo Lula em si, que não tem instrução além da quinta série, mas pelos seus apoios) do PT, que adota uma política com suas típicas práticas heterodoxas (aumento de gastos, controle de preços, subsídios, empréstimos equivocados, programas governamentais perdulários e ineficientes etc), que comprovadamente nunca funcionaram e nunca funcionarão.

O governo “socialista” da Argentina acaba de adotar um congelamento de preços de 1.247 produtos para lidar com sua inflação de 2 dígitos.

Só que qualquer pessoa que leu algumas páginas de algum compêndio de economia sabe que esse tipo de medida termina desaguando em desabastecimento no mercado oficial e o florescimento do mercado negro, além de não ter nenhum efeito prático sobre a inflação.

Com isso tudo, a economia, adicionando-se com largas porções de corrupção impregnada, tende invariavelmente a naufragar, porque o bolo vai encolhendo e encolhendo, já que estamos muito longe de um cenário de brilho das commodities que o Brasil viveu entre 2003 e 2008 e o bom, mas corrupto Palocci, é coisa do passado, uma vez que foi sucedida pelo desastroso réu Guido Mantega, ainda no segundo governo Lula; com sua tenebrosa NME (Nova Matriz Econômica), implantada a partir de 2011.

Outras mazelas incluem alianças com países irrelevantes, por motivos ideológicos (como, por exemplo, o fracassado grupo do Mercosul) e/ou corruptos e o desrespeito velado à liberdade de imprensa, sob o nome “suave” de regulamentação da mídia, que ele tentou e tentará passa pela goela do congresso.

Só que mesmo não arrasando a Economia nem de longe no mesmo quilate do PT, sendo apenas ruim, o governo Bolsonaro é péssimo em quase todos os outros quesitos, incluindo a gestão da pandemia da COVID-19 e a questão do combate à corrupção, tema tão in no tempo da candidatura, simbolizado pela escolha do ex-juiz Sérgio Moro para a justiça.

A mentira no governo atual é tão prevalente que é praticada mesmo quando pode ser quase instantaneamente refutada.

Por exemplo, em sua live de 14 de outubro, Bolsonaro comentou:

“Eu estou vendo aqui que a AstraZeneca e a Pfizer estão lançando um comprimidinho para você, uma vez contraído o vírus, para você tomar esse comprimidinho. O outro, aquele outro, da ivermectina, para piolho, não vale não, tá? Esse aqui vale. Ou melhor, vai valer. (…) Agora, o da AstraZeneca, esse novo remédio da AstraZeneca (…). Esse remédio combate também? Não vai estar na bula, tá? Mas já sabemos que combate também piolho, ascaridíase, escabiose, elefantíase? Ou seja, combate a mesma coisa que esse nosso, brasileiro, aqui, que é usado para combater piolho.”

Só que o remédio proposto pela AstraZeneca é um coquetel injetável de anticorpos, nada ligado a doenças parasitárias e o remédio da Pfizer não tem nenhuma conexão com antiparasitários, como ela mesma afirmou em nota.

“O antiviral não apresenta qualquer semelhança com a hidroxicloroquina (utilizado como antimalárico e para tratamento de algumas doenças reumatológicas), azitromicina (antibiótico) ou ivermectina (antiparasitário), ou seja, são compostos com estruturas químicas e mecanismos de ação totalmente diferentes”

✱✱✱

O problema é que uma economia arrasada termina sendo, em médio prazo, pior para o povo como um todo do que todos os outros itens somados, porque representa menos empregos e mais fome.

Enfim, apesar de todos os pesares, temos ainda a perspectiva de voltar um pouco acima do nível de 2019, em termos de PIB, com um aumento previsto de 5,01% em 2021 do instituto Focus, contra uma queda de 4,1% em 2020.

✱✱✱

Enfim, rezo para que apareça qualquer ser humano, montado em um cavalo branco e tire a presidência de um desses dois enviados pelo apocalipse…

Paulo Buchsbaum

Fui geofísico da Petrobras, depois fiz mestrado em Tecnologia na PUC-RJ, fui professor universitário da PUC e UFF, hoje sou consultor de negócios e já escrevi 3 livros: "Frases Geniais", "Do Bestial ao Genial" e um livro de administração: "Negócios S/A". Tenho o lance de exatas, mas me interesso e leio sobre quase tudo e tenho paixão por escrever, atirando em muitas direções.

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5 Comentários

  1. Bolsonaro é um idiota que sabe falar para o seu público-alvo. Lula é um cara esperto que sabe falar para seu público-alvo.
    O problema é que o público-alvo deles sempre foram os radicais de plantão. E aí?

    1. Sim, ambos só agradam a quem já gosta deles. O problema é que a memória curta, é muito provável que, assim como o Lula nos trouxe o Bolsonaro, o Bolsonano nos legue o Lula. Um extremo termina ajudando o extremo do outro lado, ainda que involuntariamente.

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