Brasil

A corrida maluca de 2018

As eleições de 2018 prometem ser as mais disputadas da história, com um nível de pulverização comparável à de 1989. Naquela época, foram onze os candidatos com razoável grau de visibilidade: Fernando Collor, Lula, Leonel Brizola, Mário Covas, Paulo Maluf, Afif Domingos, Ulisses Guimarães, Roberto Freire, Ronaldo Caiado, Aureliano Chaves e Afonso Camargo. Havia mais onze postulantes, entre eles o legendário Enéas Carneiro.

Em 1989, encerrava-se um ciclo de quase 30 anos sem eleições diretas para presidente, finalizados com o mandato para lá de turbulento de José Sarney, um chefe de estado altamente impopular. A economia em frangalhos, o baixo crescimento e a inflação nas alturas davam o tom do cotidiano brasileiro.

Fernando Collor foi para o segundo turno com 30% dos votos. Lula, o segundo colocado, teve 17.1% pouquíssimo à frente de Leonel Brizola, o terceiro, com 16.5%. Mario Covas veio na sequência com 11.5%, seguido por Maluf (8.9%), Afif (4.8%) e Ulisses (4.7%). Roberto Freire, então comunista, foi o último a superar a marca de 1.0%, os demais ficaram abaixo dela. Sete candidatos superaram 4% dos votos, situação que nunca mais ocorreu. Em 1994 foram quatro (FHC, Lula, Enéas e Quércia), três em 1998 (FHC, Lula e Ciro), quatro em 2002 (Lula, Serra, Garotinho e Ciro), três em 2006 (Lula, Alckmin e Heloísa Helena), em 2010 (Dilma, Serra e Marina), e em 2014 (Dilma, Aécio e Marina). Tudo indica que em 2018 teremos um cenário mais parecido com o de 1989.

No final do ano que vem, a economia já mostrará sinais de recuperação. Após o período mais recessivo de todos os tempos, o desemprego, ainda alto, estará em queda e a inflação, sob controle. O sistema político viverá sobre os escombros causados pelo tsunami Lavajato, que tem colaborado para desbaratar o que por muitos é tido como o maior esquema de corrupção da história da humanidade, impregnado no DNA de praticamente todos os partidos, em particular daqueles mais próximos ao poder. O governo Temer terminará seu mandato altamente impopular, igual ou pior ao último ‘pmdebista’ a ocupar o cargo.

E quem seriam os postulantes a ‘salvadores da pátria’? Para começar: Geraldo Alckmin, Jair Bolsonaro, Fernando Haddad, Marina Silva, Álvaro Dias, Ciro Gomes,e Henrique Meirelles, sem contar os nanicos. Já temos sete nomes e certamente outros surgirão até o começo da corrida eleitoral.

Notem que excluí da lista o ‘messias’ Lula, pois ele estará impedido de concorrer pela Justiça. Também não estou considerando João Dória, pois não terá o apoio da máquina tucana, deve perder a queda de braço com seu padrinho Geraldo. Além disso, há sinais de que a onda Dória está passando. A partir do momento em que o velho PT do Jararaca submerge na lama da corrupção, o discurso ‘dorista’, baseado no antagonismo contra o príncipal líder petista, perderá força. E ele tem uma cidade complexa para administrar, a provável queda em sua taxa de aprovação vai lhe tirar pontos na disputa pela ‘vaga’ de candidato.

Na ausência de seu líder supremo, o PT deve apoiar quem ele indicar. O velho condenado já deu sinais de que sua preferência é por Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, que não conseguiu sequer se qualificar para o segundo turno das eleições municipais. Outra possibilidade seria Jacques Wagner, o falastrão ex-governador baiano e ministro de Dilma. A esquerda ainda terá a opção do boquirroto Ciro Gomes, aquele que sempre morre pela boca e com esperanças de aglutinar os votos usualmente conferidos ao petismo. Além de ambos, provavelmente teremos o PSOL representado na figura de algum radical de plantão. Com o desmonte do PT, os psolistas podem almejar, quem sabe, triplicar ou quadruplicar sua última votação, ligeiramente superior a 1%.

Falta-nos saber o que farão DEM, PMDB e PSB. O primeiro, adquiriu súbida notoriedade com a ascensão de Rodrigo Maia à presidência da Câmara, e ensaia uma recuperação de sua musculatura eleitoral. Pode lançar candidato próprio, ou apoiar um terceiro(a). Tem flertado com João Dória. É questionável se pretende compor novamente com o desgastado PSDB, de quem foi coadjuvante nos últimos 24 anos, mas o fato é que os ‘Democratas’ ano que vem terão um protagonismo inédito nesse século.

O PMDB é um caso à parte. Saco de gatunos das mais diversas linhagens, exerce o poder em sua plenitude, após 26 anos de bastidores. A cúpula do partido, se não for reeleita para se aproveitar do foro privilegiado, terá problemas com a justiça comum. Será difícil, mas não impossível, que lancem candidato próprio. Difícil por que o sujeito carregará nas costas o fardo de um Temer durante a campanha. Porém, a eleição altamente fragmentada pode abrir uma janela de oportunidade, um candidato(a) com menos de 20% terá chances de chegar ao segundo turno. Se não quiser alçar voo próprio, o PMDB negociará seu maior ativo, o tempo de TV, com o ‘profissionalismo’ que lhe é característico, um apoio muito importante para quem o receber.

O PSB abrigou a Rede na última eleição e hoje não sabe se faz uma guinada à esquerda, apoiando Ciro Gomes ou o candidato petista, ou ao centro, se juntando à caravana de Geraldo Alckmin, com quem tem uma sólida aliança em São Paulo. Mas não são socialistas? Não se esqueça de que no Brasil o nome do partido não significa nada em relação ao seu comportamento ou linha ideológica.

Geraldo Alckmin deve se firmar como o candidato tucano. Muitos dirão que lhe faltarão votos, mas com 14 anos à frente do estado mais rico do país, é melhor não subestimar seu potencial de chegada. E uma vez lá, dependendo de seu oponente, pode se viabilizar. A seu favor, o fato de que a Lavajato não arranhou, por ora, a sua imagem. Se não está imaculado (seu nome é citado em delações da Odebrecht, por enquanto sem maiores detalhes ou provas), também não está enlameado. Seu desejo é enfrentar Jair Bolsonaro em um eventual segundo turno, situação que poderia fazê-lo aglutinar os votos à esquerda.

Bolsonaro é um candidato paradoxal. Apoiado por um segmento mais conservador do eleitorado, seu ideário econômico nacionalista não está muito distante daquele comungado por Dilma. Ganha admiradores com frases de efeito e pelo mérito de estar completamente à margem das denúncias de corrupção que assolam a capital federal. Será candidato por um partido nanico e sem tempo de TV. Se por um lado isso atrapalha sua exposição, por outro poderá lhe ajudar, pois quanto mais superficial ele for, menos estará expondo sua falta de conteúdo. Deverá pautar sua campanha nas redes sociais, e sua efetividade ainda é uma incógnita. Hoje, Bolsonaro pode ser tanto o azarão que chegará a todo vapor para o segundo turno, quanto o cavalo paraguaio que perde fôlego no meio da corrida.


Marina Silva já não é uma novidade. Veterana de duas eleições onde conquistou aproximadamente 20% dos votos, se repetir esse percentual poderá disputar o segundo turno. A diferença é que nos pleitos anteriores havia três candidatos competitivos e ano que vem, como sabemos, teremos bem mais que isso, o que poderá desidratar a candidatura da ambientalista. Além disso, não terá tempo de TV, a menos que faça alianças, o que é improvável. O discurso da ‘nova política’ que já está na ‘meia idade’ parece ter perdido força, mas o tempo pode desmentir essa impressão. Ninguém está tão distante de um provável índice de ‘passagem’ ao segundo turno a ponto de ser descartado como possibilidade.

Álvaro Dias é um senador combativo, uma das poucas vozes tucanas que não se apequenou durante os governos petistas, saiu do partido que não lhe dava espaço e está no ‘Podemos’, nome novo do antigo PST. Livre de quaisquer delações, usará essa situação a seu favor. Também desprovido de tempo de TV e pouco conhecido do grande público, em tese terá poucas chances.

Henrique Meirelles, fiador da estabilidade dos governos Lula e Temer, no comando da equipe econômica atual, é o sonho de consumo do PSD para chegar à presidência. Lembremo-nos aqui do que é esse partido, pelas palavras de seu próprio presidente Gilberto Kassab: nem de esquerda, nem de direita, nem governo, nem oposição. Um partido camaleão, que se adapta a qualquer estação, faça chuva ou faça sol. Com um número razoável de parlamentares, pode proporcionar ao seu candidato ou a quem apoiar, valiosos minutos de TV. Contra Meirelles estão a sua falta de carisma e a proximidade com os irmãos Batista (até há pouco tempo era sócio do Banco Original). A seu favor, estará a economia, se de fato ela melhorar com mais vigor ano que vem. Os mais otimistas já apostam em crescimento de 3% com queda acentuada do desemprego no quarto trimestre, isso certamente será um belo cartão de visitas em um país que experimentou o abismo. Um bom marqueteiro pode cuidar do carisma, mas doze meses de Brasil pela frente também podem trazer surpresas desagradáveis ao ministro.

Ainda há tempo para surgir um ‘outsider’, alguém que venha do nada e atropele os representantes do ‘establishment’, que em maior ou menor escala está vinculado aos nomes já citados. Também é possível que políticos conhecidos ainda não candidatos entrem no jogo. Se a minha teoria estiver certa, alguém com 15% pode chegar ao segundo turno, isso é um estímulo aos marinheiros de primeira viagem.

Nenhum instituto de pesquisa colocou esse cenário à prova. Eles insistem em manter o velho condenado em todas as simulações, ignorando que seu destino está nas mãos da Justiça, que confirmou 95% das sentenças da primeira instância. Mas as pesquisas tem pouco valor nesse momento. O jogo começará no segundo semestre de 2018, antes disso é treino. Será uma partida faltosa, truncada, com muitos passes errados, expulsões e pancadaria. Tomara que termine bem…para nós.

Victor Loyola

Victor Loyola, engenheiro eletrônico que faz carreira no mercado financeiro, e que desde 2012 alimenta seu blog com textos sobre os mais diversos assuntos, agora incluído sob a plataforma do Boteco, cuja missão é disseminar boa leitura, tanto como informação, quanto opinião.

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