Política

Lula perdeu a fé em Lula. E isto pode mudar tudo…

Dou aulas e palestras há mais de trinta anos, e acabei aprendendo muita coisa sobre “falar em público”, tanto é que hoje dou treinamentos nesta área (espero que agora, com a volta dos eventos presenciais, este mercado cresça novamente). Assisti este vídeo do Lula (ver https://www.youtube.com/watch?v=5atFhsieXeM ) e confesso que fiquei preocupado com algumas coisas. Aviso desde já que esta é uma análise técnica, sem qualquer viés político.

Antes, um flashback; em 2006, numa das dezenas de inaugurações do COMPERJ (alguém lembra dele? Pois é…) tive a oportunidade de assistir um discurso de improviso do Lula a menos de vinte metros dele. O mínimo que posso dizer é que fiquei impressionado, tipo “nunca vi um talento igual”. Mesmo com as dificuldades da voz rouca, língua presa e pouco conhecimento do idioma, Lula tinha um brilho de estrela de primeira grandeza. Em menos de dez minutos ele convenceu o respeitável público (inclusive eu) que o COMPERJ ia ser um sucesso, a Petrobras ia ser a maior empresa do mundo e nós, brasileiros, seríamos felizes para sempre. Não é por pouca coisa que, mesmo sem falar inglês, foi apontado por ninguém menos que Barack Obama como “o cara”. Só que…

Lula não consegue mais vender suas ilusões. Provavelmente porque não acredita mais nelas

O vídeo a que me referi no início do texto foi gravado durante um discurso de Lula em Niterói (RJ), há uma semana, e embora dure pouco mais de dois minutos já dá uma boa amostra da decadência do astro-rei. A figura de Lula está péssima; camisa ensopada de suor (tudo bem que estava quente, mesmo), cabelo desalinhado, passos hesitantes. Além disto, é evidente o seu esforço para arrancar as palavras da garganta. E, last but not the least, não tem mais o brilho nos olhos que empolgava a audiência nos seus bons tempos. Uma evidência bastante forte disto é que ele passa um bom tempo de costas para a plateia, buscando contato visual e apoio de seus pares, um sintoma claro de insegurança, para quem conhece do assunto.

Sob este aspecto, uma das primeiras dicas que se passa a quem vai falar em público é justamente esta; se você não acredita no que está falando, ninguém vai acreditar. Certamente, o Lula que eu vi e ouvi em 2006 irradiava certezas e brilho. Vou tentar analisar, da forma mais técnica possível, o que me parece estar acontecendo.

“O tempo é lobo, e crava suas garras” (Renato Borghetti, compositor gaúcho)

Meu diagnóstico é que há dois problemas principais; o primeiro é que Lula está com 76 anos, nunca teve hábitos saudáveis, já lutou com um câncer, enfim, seu corpo emite sinais altamente preocupantes de desgaste. E olha que a campanha mal começou.

O segundo ponto é mais uma inferência que eu faço a partir dos fatos. A impressão que tenho é que Lula deixou de acreditar em Lula. Dando um exemplo óbvio, em 2006 o COMPERJ era uma promessa, hoje é um ferro velho onde a Petrobras enterrou 14 bilhões de reais, num projeto minado por um esquema de populismo e corrupção que quase quebrou a empresa. E Lula sabe disto. Embora tenha seu ego massageado diariamente por milhões de apoiadores que, cegos aos fatos e evidências, continuam repetindo mecanicamente “Lula! Lula! Lula!”, ele, que é muito mais inteligente que toda a sua militância junta, sabe que seu telhado agora é de vidro. Sabe também que só se livrou da cadeia graças a uma articulação jurídico-política muito bem elaborada, mas que se não se eleger, pode voltar prá lá, porque sua culpa em cartório é mais do que evidente.

Assim, mesmo que os institutos de pesquisas se esforcem para atribuir-lhe um favoritismo absoluto, fica cada vez mais clara a tendência à queda. E, com um mau desempenho naquilo em que sempre foi forte, os comícios e pronunciamentos entusiasmados, hoje já se enxerga uma possibilidade concreta de que venha a ser derrotado por Bolsonaro em um eventual segundo turno. Convenhamos que, para alguém que um dia já foi forte candidato a maior líder de esquerda da América e um dos principais do mundo, perder para um sujeito do nível do Bolsonaro é um fim de carreira prá lá de humilhante.

Será que Lula gosta do que vê no espelho?

Saint-Exupéry, o grande escritor francês, dizia que, inexoravelmente, todos nós teremos que ficar a sós diante do espelho algum dia. E que, dependendo das escolhas que fizermos na vida, este poderá ser o melhor ou o pior de nossos dias. A impressão que passa é que Lula cada vez gosta menos do que vê no espelho.

Sim, porque ele tinha potencial para ser o grande líder que o Brasil precisou desde sempre. Inteligente, carismático e com uma história épica de vida, era o sujeito enviado pelos céus para nos resgatar – uma espécie de Mandela, ou Luther King. Enfim, Lula fez suas escolhas, e acredito que, em algum lugar da sua mente, se arrepende delas. E hoje, sendo forçado pelas circunstâncias a dizer coisas que ele mesmo sabe que não passam de mentiras e meias-verdades, como a personagem do “Folhetim”, do gênio Chico Buarque, ele parece decepcionado consigo mesmo. É a impressão que passa, claramente.

No outro canto do ringue Bolsonaro é um troglodita que não tem crises existenciais, um medíocre que adora ser medíocre, um cara sem talento até para armar um esquema de corrupção eficiente, alguém capaz de ser anti-vacina, fazer piadinhas com torturadores e torturados da Ditadura, e no meio de uma crise nacional, declarar, com indisfarçável orgulho, que seu filhote já tinha “pegado” o condomínio inteiro (tudo bem, foi só metade). Um bufão no salão, conforme diria o grande Ed Mota. Um presidente que nos envergonha. Mas que pode ser reeleito em cima de Lula. Vergonha entre vergonhas.

Epílogo – será que tem luz no fim deste túnel?

Não tenho bola de cristal, mas “prevejo dificuldades” para Lula ao longo da campanha. E talvez este jogo complexo desemboque em uma situação inusitada, mas que pode acabar sendo boa prá todo mundo. Traçando um cenário totalmente não ortodoxo, mas nem por isto desprovido de sentido, imagino que talvez uma eventual renúncia de Lula à candidatura, em função de todas estas circunstâncias, pode ser um golpe fatal para Bolsonaro; afinal boa parte do eleitorado de Bolsonaro vota nele muito mais pelo medo da volta de Lula que pelas suas “qualidades” altamente contestáveis (lembrando que, da mesma forma, boa parte do eleitorado de Lula vota nele por achar que ele é a única opção a Bolsonaro).

Neste cenário, a briga entre os nanicos para ser a tal “terceira via” que não se firma de jeito nenhum, passaria a ser uma disputa sobre quem iria para o segundo turno com Bolsonaro (partindo do princípio que ele não terá 50% dos votos, o que é praticamente certo). Neste contexto, entendo que qualquer que seja este candidato (Ciro Gomes, Sérgio Moro, João Dória ou até algum quadro da esquerda que seja palatável), vai ter boas chances de arrumar costuras políticas que sejam suficientes para derrotar Bolsonaro. E o Brasil iniciaria o seu terceiro século de vida com um presidente que não seria Lula, nem Bolsonaro. E aí eu vou tomar um porre, não me segurem nem me esperem em casa antes do sol raiar…

Tudo bem, é um sonho maluco. Mas sonhar não custa nada…

Quem viver, verá.

Marcio Hervé

Márcio Hervé, 71 anos, engenheiro aposentado da Petrobras, gaúcho radicado no Rio desde 1976 mas gremista até hoje. Especializado em Gestão de Projetos, é palestrante, professor, tem um livro publicado (Surfando a Terceira Onda no Gerenciamento de Projetos) e escreve artigos sobre qualquer assunto desde os tempos do jornal mural do colégio; hoje, mais moderno, usa o LinkedIn, o Facebook, o Boteco ou qualquer lugar que aceite publicá-lo. Tem um casal de filhos e um casal de netos., mas não é dono de ninguém; só vale se for por amor.

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4 Comentários

  1. Prezado Hervé, excelente texto. Apesar de concordar com todos os pontos que vc listou, tenho em mente que o ego de Lula é tão grande, mas tão grande, que beira a patologia.

    Mas ele não é bobo, e certamente está pesando os prós x contras (que são muitos, alguns vc listou) de concorrer às Eleições presidenciais.

    Caso ele não concorra, teríamos inclusive alguns efeitos benéficos, sendo o maior deles – em minha visão – a não eleição de Bolsonaro. Ambos se necessitam para terem chance. Sem um deles, ambos não tem chance.

    Um forte abraço, e obrigado pelo texto.

  2. Creio que Lula está numa tremenda sinuca: a única chance de ter paz é ganhar a Presidência – mas ele sabe que terá quatro anos terríveis para conter os radicais progressistas (que querem mudanças “no tapa”) e o povo, que vai querer a volta dos bons tempos de qualquer jeito.

  3. Autor com medo de perder as mordomias da Petrus
    Caricaturou o inimigo (capitão).
    Tendencioso .Sub-reptício .
    Estou achando ate que o autor tem medo da privatização da Petrobras .
    E agora quer ser afastar das “mercadorias “ do Lula

  4. O autor começa avisando que não vai ter viés político.

    E passa o texto inteiro elogiando o “grande homem” que o corrupto condenado é, ao mesmo tempo que coloca o atual presidente como medíocre e criminoso. Das duas uma, ou é mentiroso ou incapaz de suprir a sua ideologia.

    Haja inveja e desrespeito com o instituto da presidência e com os milhões de eleitores que escolheram o atual mandatário.

    Lula está acabado por ser um ladrão, sociopata e preguiçoso, nenhum pensamento dele nos últimos 50 anos foram para o bem da nação, sempre foi projeto pessoal de poder.

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