Atualidades

Caindo de maduro ou arrancado à força?

Há rumores cada vez mais fortes de que os EUA preparam alguma ação para derrubar o ditador Nicolas Maduro do poder na Venezuela.

Como ainda são indícios que não se converteram em realidade, estamos especulando. Afinal, rumores sobre planos mirabolantes e conspirações nao faltam no mundo conectado atual.

Mas vamos ao tópico para o qual pretendo chamar atenção e que se tornará motivo de debate caso, de fato, essa situação se materialize.

Sabemos que Maduro é um ditador que persegue opositores através de eliminação ou encarceramento, tem os poderes cooptados, particularmente o Judiciário e tornou-se base de apoio para narcotraficantes. A Venezuela, em outros tempos um dos países mais prósperos da região, hoje aparece nas últimas colocações de quaisquer indicadores sociais. Resumindo, Maduro destrói lentamente o seu país. Não há dúvidas de que estamos diante de um câncer.

A questão: seria legítimo um país interferir em outro, destituindo seu governo? Segundo “Painho”, esse grande “filósofo” tabajara à frente do Brasil, a Venezuela seria assunto dos venezuelanos e ninguém mais.

Mas os venezuelanos são uma espécie de povo prisioneiro, e qualquer manifestação de oposição ao seu ditador é contundentemente oprimida, o que nos leva à conclusão de que a tese de “Painho” não levaria à alternância de poder naquele país, uma vez que a força da ditadura não permitiria emergir qualquer movimento contrário ao status quo. Ou seja, sua derivada é a perpetuação de Maduro no poder.

A tese oposta legitimaria invadir e derrubar uma ditadura que causa mal ao seus cidadãos, quais seriam os critérios que poderiam justificar essa ação? Aqui a conversa começa a ficar espinhosa, pois a depender da resposta (se muito julgamental), teríamos embasamento para invasões diversas ao redor do mundo. Até o Putin poderia abraçar o argumento…

Caso a ação se concretize, a justificativa usada seria de que o governo do ditador Maduro estaria colaborando com narcotraficantes, tornando-se assim um ‘Narcoestado’ e passível de uma ação americana. É uma razão, que se esticada, poderia até justificar uma invasão ao México. Certamente ganharia detratores ao redor do mundo.

O ditador Maduro faz mal ao seu país. Como ele, já houve tantos outros mundo afora e versões similares existem por aí. Afinal, quanto o Vladimir Putin difere do seu pupilo venezuelano? Talvez o fato de ter o maior arsenal atômico em seu poder. Ninguém ousaria interferir na mãe Rússia, ‘tio Vlad’ é especialista em derrubar aviões e envenenar opositores e fica por isso mesmo…

Ficamos no exemplo do ditador mais poderoso dos tempos atuais, há outros mais ‘pé de chinelo’ que não sofrem o risco de uma invasão. Mesmo Cuba, há décadas sob a mão de ferro dos Castro, não chegou a sofrer intervenção. No caso da Venezuela, há um adendo: trata-se do país com as maiores reservas de petróleo do planeta, superiores inclusive às da Arábia Saudita (me refiro às reservas, e não à produção). Economicamente, portanto, a Venezuela como enclave da Rússia e patrocinadora do narcotráfico incomoda muito mais que Cuba. Quer dizer então que se a Venezuela não detivesse tanto “ouro negro”, Maduro estaria muito mais tranquilo em relação a exercer sua ditadura sem ameaças externas? Não temos um universo paralelo para cravar uma resposta, mas eu acredito que sim.

Voltando ao ponto. É legítimo eliminar o “mal”, mesmo ele estando fora de sua jurisdição? Uma analogia um tanto tosca, mas que poderia ser aplicada aqui: imagine que você sabe, de ouvir falar, e até de presenciar cenas à distância, que um vizinho na quadra em que você mora bate frequentemente na mulher e nos filhos. Você o denunciaria à polícia, ou isso não é da sua conta? Obviamente que o ato de denunciar aqui funciona como uma intervenção na vida alheia e quero colocá-lo como analálogo à derrocada de Maduro por forças externas.

Caso você fizesse a denúncia, um amigo seu lhe diz que lá no bairro onde ele mora também há um caso como esse. Temeroso de fazer por si e admirador de sua coragem, pede que você reedite sua ação e compareça à delegacia com nova denúncia. Embora lamentando o fato, você não o vê com força suficiente para movê-lo adiante, afinal, ocorre em outro bairro e você nunca presenciou a cena de violência. Seu amigo então questiona a sua coerência e fica sem resposta.

Voltemos ao caso do imbróglio no Caribe. A derrocada de um regime ditatorial como o de Maduro será sempre motivo de júbilo, particularmente aos que sofrem na mão do canalha. Porém, há alguns efeitos colaterais caso seja causada por uma ação externa, e os EUA ficariam na situação do protagonista da minha analogia acima.

Exerceriam o mesmo papel sobre qualquer ditadura do mundo? Provavelmente não.
Então, claro que mesmo que uma deposição de um crápula seja um desfecho positivo, sua justificativa não é baseada em altruísmo, mas em interesses econômicos e geopolíticos.

E pragmaticamente falando, o mundo não está alicerçado sobre regras de governança claras e justas seguidas por todos os paises. No fundo ainda vigora a regra do “manda quem pode, obedece quem tem juízo’. Um Brasil ou México jamais teriam o poder de coerção de uma potência como os EUA, tampouco experimentam o telhado de vidro (para onde se atiram pedras) decorrente de dilemas morais.

Mas os EUA toleraram o ditador por tantos anos, por que somente agora? Provavelmente por que ele ultrapassou algumas fronteiras: narcotráfico, proximidade de China e Rússia (além obviamente das gigantescas reservas de petróleo).
Se ocorrer alguma disruptura, será em benefício da população da Venezuela, mas não terá sido por ela, não sejamos ingênuos.

Ps** Em tempo: eu torço pela queda desse ditador, mesmo que seja via uma intervenção externa. Serei sempre contra ditaduras, de qualquer natureza. E na disputa das superpotências, entre EUA e China, sou time EUA desde sempre.

Victor Loyola

Victor Loyola, engenheiro eletrônico que faz carreira no mercado financeiro, e que desde 2012 alimenta seu blog com textos sobre os mais diversos assuntos, agora incluído sob a plataforma do Boteco, cuja missão é disseminar boa leitura, tanto como informação, quanto opinião.

Artigos relacionados

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo
Send this to a friend