A Direita se mata, o PT gasta e o Mercado sorri. Mas, até quando?

E, como previsto, a megaoperação no RJ deu um baque na popularidade de Lula, que vinha surfando a onda das trapalhadas do bolsonarismo, principalmente na questão da soberania. Quais são os possíveis cenários até a eleição? A direita vai conseguir se unir o suficiente para derrotar o PT com a máquina na mão? O bolsonarismo está disposto a perder protagonismo para apoiar um nome mais ao centro, com mais potencial de atrair os centristas que decidiram a ultima eleição em favor do Lula? Ou preferirá assistir a uma vitória de Pirro do PT para tentar voltar em 2030, talvez com o próprio Bolsonaro?
E a economia? Terá fôlego para aguentar mais um ano de aumento de gastos? O arcabouço seguirá retirando de suas metas já frouxas despesas que são empurradas para a dívida pública, que continua crescendo sem controle?
E o mercado? Como explicar a atual euforia, mesmo com a previsão do próprio governo de que, em 2027, faltará dinheiro para despesas discricionárias?
A guerra civil da direita
Comecemos pela oposição. Hoje, existem quatro “direitas” se digladiando:
- O bolsonarismo raiz, que não aceita outro nome na urna a não ser um Bolsonaro. Com a inviabilização de Eduardo Bolsonaro, podem sobrar Flávio ou talvez Michelle, caso consigam se entender entre eles próprios, algo já bem difícil. O fato novo é que Carluxo, que odeia a Michele, andou elogiando o papel dela para o pai doente.
- Os candidatos a herdeiros do espólio bolsonarista — Tarcísio, Ratinho Jr., Caiado, Zema — todos contando com o apoio dos caciques do centrão para convencer os bolsonaristas de que são a melhor opção para derrotar o petismo. O receio dos bolsonaristas raiz é que rei morto é rei posto. Se oeventual ungido consegue fazer um bom governo, Bolsonaro tende a virar página virada.
- A centro-direita de Eduardo Leite (ou qualquer outro nome fora da polarização), que dificilmente conseguirá se viabilizar, apesar do desejo demonstrado pela maioria do eleitorado nas pesquisas. Sobra potencial, falta engajamento. Só um fato novo, um desgaste brutal dos dois polos simultaneamente poderia transformar um Eduardo Leite (ou quem sabe um Paulo Hartung) numa espécie de Macron brasileiro.
- A direita do MBL, menor, mas muito barulhenta, capaz de pautar o debate público e com grande potencial de crescimento nos próximos anos. Pontuado pela primeira vez na pesquisa Quaest, o candidato da Missão, Renan Santos, está em terceiro lugar nas apostas do site Polymarket com 6%.
Certamente, o candidato da direita que enfrentará o PT no segundo turno sairá do segundo grupo. A grande dúvida é o tamanho da parcela dos grupos dissidentes que preferirá votar no PT para derrotar o “inimigo interno” do próprio campo. Em uma eleição tão apertada como a que se avizinha, esses votos terão pesos dobrados.
Tarcísio, o preferido do mercado, iniciou 2024 à frente de Lula nas pesquisas. Na Quaest desta semana, mesmo com a deterioração da popularidade do presidente, ainda aparece 5 pontos atrás em uma simulação de segundo turno. Seu desgaste se deve muito mais ao fogo amigo do bolsonarismo raiz do que a qualquer outra coisa. E, com a pauta de segurança pública em alta, o menor índice de criminalidade do país é uma de suas maiores vitrines, além da atuação de desmonte da Cracolândia.
Ratinho Jr. corre por fora, mas, caso Tarcísio desista da disputa, pode se tornar um candidato ainda mais incômodo ao PT, por sofrer menos desgaste junto ao bolsonarismo raiz, além de ter muito o que mostrar nos seus dois bons madatos. Caiado e Zema seguem correndo por fora, com uma potencial nova companhia: Cláudio Castro, nome já cogitado pelos caciques do centrão.
Os rumos da economia
Numa eleição tão disputada, a percepção de melhora ou piora da economia será decisiva. A favor de Lula, temos o dólar em queda no mundo todo (juntamente com os juros norte-americanos), o que contribui para o controle da inflação por aqui, juntamente com os efeitos cumulativos de meses com juros na casa dos 15%. Ao mesmo tempo, nossos juros nas alturas atrai investidores internacionais em busca das pechinchas na nossa bolsa e da nossa renda fixa. Não por acaso a bolsa está nas máximas, impulsionada também pela perspectiva de queda da Selic — movimento que migra parte significativa do dinheiro da renda fixa para a renda variável.
Contra o governo pesam o expressivo aumento do endividamento público: projeção do próprio Ministério da Fazenda aponta para 82,3% do PIB em 2026 — quase dez pontos acima do patamar herdado do governo anterior — e perto de 100% do PIB pela metodologia do FMI.
Paralelamente, o endividamento das famílias segue batendo recordes: cerca de 77% das famílias possuem algum tipo de dívida, com a inadimplência chegando a quase 30% em 2024. Dados da CNDL/SPC Brasil mostram que, em março de 2025, 42,01% dos adultos estavam negativados — cerca de 70 milhões de pessoas — com dívida média em torno de R$ 4.604.
Do lado das empresas, o cenário não é melhor. Segundo a Serasa Experian, a inadimplência empresarial está em níveis recordes: até agosto de 2025, 8,1 milhões de CNPJs estavam negativados, o maior número da série histórica. Na mesma direção, cresce o número de pedidos de recuperação judicial e falências, com previsão de aumento de 18% em 2026, segundo Assis Moreira (Valor International).
E, tal como no período pré-crise Dilma, as estatais — que ajudaram a bancar as contas públicas nos governos Temer e Bolsonaro, batendo recordes de lucro — começam a apresentar rachaduras após voltarem às mãos do PT. Sob o Lula 3, as empresas federais acumularam déficit primário de R$ 18,5 bilhões (excluindo Petrobras e bancos públicos), o maior já registrado para o período em toda a série histórica. E isso enquanto várias estatais ainda nem sentiram integralmente as intervenções, por causa da Lei das Estatais aprovada no governo Temer — que o PT tenta “flexibilizar” de todas as formas.
Nos demais órgãos públicos, em contraste com novos programas como o Pé de Meia, começa a faltar dinheiro até para pagar contas básicas, como energia elétrica. No INSS, há inclusive ameaça de paralisação por falta de recursos devido ao contingenciamento. E 2027 ainda nem chegou.
Um equilíbrio cada vez mais instável
O governo segue pagando quase um trilhão de reais em juros da dívida (quase dobrando o que Bolsonaro pagou em 2022 – R$ 575,6 bilhões), com queda de investimentos e crescente pressão fiscal, num cenário em que o motor do estímulo ao consumo via crédito dá claros sinais de exaustão — tanto pelo endividamento recorde das famílias quanto pelo das empresas e do próprio setor público.
O resumo da ópera é que Lula, como previsto, novamente fez uma farra com o cartão de crédito do Tesouro e deixará para o próximo quadriênio uma verdadeira “pandemia” de dívidas. A dúvida do eleitor de centro — que novamente deve decidir a eleição — é se será melhor deixar a bomba estourar no colo do próprio PT para sepultá-lo de vez, ou apostar na oposição, que pode acabar se desgastando o suficiente para trazer o PT de volta em 2030.
Seja qual for o governo, não restará alternativas para controlar a dívida senão segurar gastos e/ou aceitar um pouco mais de inflação para corroê-la. E isso, obviamente, vai cobrar um preço alto de popularidade. A questão é quando essa conta chegará: antes ou depois da eleição.




