2021: encruzilhada à vista

O auxílio emergêncial de R$ 600 distribuído mensalmente pelo governo federal à quase metade da população economicamente ativa durante os meses de pandemia traz à tona alguns fatos relevantes:

Agora que começamos a nos encaminhar para a parte final da pandemia, com R0 do país já < 1 e início da redução dos obitos diários, veremos com mais frequência nos noticiários temas relacionados à economia, cujo resultado para 2020 não deve ser tão ruim quanto inicialmente previsto, uma queda de 5% no PIB (por ora a expectativa de boa parte dos analistas) provavelmente melhor que o global em termos comparativos.

Há muito tempo que nosso desempenho era pior que o do mundo. Em 2015, tivemos a contração de 7% no PIB enquanto o planeta crescia. Ao menos esse ano, estamos acompanhados, trata-se de uma situação extraordinária.

O grande ponto de interrogação é como será 2021. O governo não tem condições de manter a rede de proteção criada pelo auxílio emergencial, mas ao mesmo tempo recebeu a sinalização de que políticas de assistência social podem render milhões de votos. Será difícil não ceder ao ‘canto da sereia’ de expansão dos gastos públicos, talvez além de sua capacidade, o que confrontaria os principios que orientam a condução da política econômica de Paulo Guedes, até então fiador da credibilidade de Bolsonaro no assunto.

Um déficit do tamanho de R$ 850 bilhões, embora compreensível em um ano como o atual, não trará vida fácil a ninguém em 2021. Se a situação já era complicada no pré pandemia, piorou muito. Em um cenário pessimista, não teríamos a recuperação em ‘V’ e isso seria catastrófico. Menos mal se a economia reagir em ‘V’ e gerar um aumento de arrecadação sem a contrapartida na despesa, mas esse é o grande desafio. Com a segunda metade de sua gestão em andamento, Bolsonaro já estará focado na reeleição, que poderá ser garantida facilmente, mas com uma bomba relógio programada para o próximo mandato. Esse filme nós já vimos em passado recente.

É muito difícil prover condições para um crescimento sustentável sem cair na mesmice da expansão do gasto público irresponsável e eleitoreiro, que normalmente termina com exuberantes voos de galinha. Reformas administrativas e tributárias que permitam desinchar o estado e torná-lo mais eficiente são necessárias, mas elas geralmente são impopulares e contrariam interesses de segmentos poderosos. É sempre mais fácil focar no curto prazo e pensar na próxima eleição, esse é o grande risco.

Estamos em uma encruzilhada. Não faltarão emoções em 2021.

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