O Brasil dos Josés

image

Eu votei nos dois Josés que se entregaram à Polícia ontem. Foi no milênio passado, em um tempo em que eles empunhavam a bandeira da ética. É fácil ser oposição, bravatear. Difícil é resistir às tentações do poder. Os dois Zés sucumbiram. Raros são os casos de resiliência. Eu votei nos Zés. Assim como eu, centenas de milhares fizeram o mesmo.

São quase 8 milhões de Josés brasileiros, ou 4% da população. Eles aparecem em todos os segmentos sociais e geografias. Mais brasileiro que José, só as 13 milhões de Marias. Eu me recordo que no começo dos anos 90, os Zés produziam um pequeno jornal em conjunto, que circulava pelos meios universitários. Eram cidadãos admirados, símbolos da resistência contra a ditadura e da ala moderna de um partido que prometia fazer diferente. Gente comum, briosa, idealista.

A derrocada de ambos não deixa de simbolizar a ruína moral em que se embrenhou o Brasil. Desde o primeiro funcionário público oficialmente designado, em 1549 ( Pero Borges, um notório corrupto condenado pela corte portuguesa), aos dias de hoje, quase 500 anos depois, o estado brasileiro serviu a interesses patrimonialistas, onde ‘ público e privado’ se confundem. As pessoas tendem a aceitar essas práticas nefastas e as praticam quando confrontadas com a oportunidade. E assim aconteceu com os Zés, que a serviço de um projeto de perpetuação de poder, rebaixaram-se à condição de criminosos. Pelo que eles representavam durante a nascente democracia brasileira, é uma derrota para os 8 milhões de Josés, representantes de 200 milhões de todos os outros nomes.

Quantos dos milhões de Josés não cederiam às mesmas tentações que derrotaram os dois Zés?  Nada corrompe tanto quanto o poder, capaz de desvirtuar os mais nobres ideais. Ao criticarmos justamente a classe política, essa ralé que nos representa e envergonha, geralmente nos esquecemos da nossa responsabilidade. Quem os elege? Quem se o omite em discutir política e prefere os tablóides de fofoca com as novidades da novela das 9 e as últimas peripécias do Justin Bieber? Quem perpetua os políticos de comportamento duvidoso?

Por outro lado, a punibilidade dos Josés também representa um sopro de esperança em um país conformado com a mesmice constrangedora dos processos de corrupção, que sempre terminavam em uma bela fornada de pizza. Talvez seja um exemplo, ainda frágil, mas nem por isso menos importante,  de que a virtude, enfim, prevalecerá.  E ela não se conquista com biografias passadas, mas renova-se a cada dia, como somatória de todas as nossas ações.

Se algum dia, em um futuro muito distante, tivermos o privilégio de contar com uma maioria virtuosa nos representando, podemos dizer que as sementes foram plantadas em um 15 de Novembro, pelas mãos de um tal Joaquim. Quantos Josés ainda hão de cair até esse dia chegar?

Sair da versão mobile