No Brasil, em se plantando tudo dá. Mas é caro.

Esta reportagem é um microcosmo do desafio que é nos livrarmos dos combustíveis fósseis, e da falácia que representa dizer que o país está “bem posicionado” nessa corrida por “energia verde”. Vou aqui focar na falácia.

É lugar comum dizer que o Brasil, por contar com uma matriz energética mais limpa que europeus e americanos, sairia na frente na produção do combustível do futuro, o hidrogênio verde. Só que não. A nossa energia é limpa, sem dúvida, mas também é uma das mais caras do mundo. Por que? Aqui entram as nossas escolhas.

Pero Vaz de Caminha informou à Corte portuguesa que aqui “em se plantando, tudo dá”. Temos uma terra rica, e muitos lamentam sermos ainda tão pobres. O problema é que a exploração econômica das riquezas naturais supõe o comércio entre os seres humanos, e o comércio supõe o estabelecimento dos preços das mercadorias. E os preços não são arbitrários. Eles são o resultado de nossas escolhas istitucionais.

No Brasil, escolhemos um arranjo que nos custa 33% do PIB em impostos. E escolhemos também taxar mais o consumo do que a renda dos cidadãos. Assim, no final, a nossa energia é das mais caras do mundo porque é uma das mais taxadas. Não tem nada a ver com a disponibilidade da riqueza, mas sim com a forma como nos organizamos como sociedade.

Abaixo dessa reportagem, há uma entrevista com uma especialista, que alerta que precisamos transformar nossas vantagens comparativas em vantagens competitivas. Perfeito. E isso só se faz com um arranjo institucional que nos permita atrair investimentos, diminuindo o “custo Brasil”. Bem, não vou aqui listar todas as nossas distorções, frutos de nossas escolhas institucionais, e que tornam o Brasil um dos países mais inóspitos do mundo para o investidor.

Mas tem mais. Além da questão mais geral, há escolhas específicas, fruto da competição de várias agendas ambientais entre si. Por exemplo, em determinado momento da matéria, alguém defende o subsídio para os produtores de hidrogênio verde. Seria, claro, “enquanto o setor engatinha”. Sabemos como isso funciona no Brasil. Essa semana, os incentivos à instalação de painéis solares foi estendido por mais 3 anos, mesmo que essa indústria não esteja mais “engatinhando”. O preço disso recai sobre os outros consumidores de energia. Os mais pobres fazem “gato” (em algumas regiões, mais de 50% da energia é roubada); os mais ricos, que não têm como instalar painéis solares, arcam com uma das contas mais caras do mundo. E os que vão “preservar o planeta” pedem mais subsídios, retroalimentando esse círculo vicioso dos preços altos da energia.

Outro exemplo: a usina de Belo Monte foi construída a fio d’água pelo impacto ambiental que teria um grande reservatório. O resultado é restrição de oferta, o que desemboca em energia mais cara, na média. Mais um: até hoje Roraima está desligada do sistema nacional de energia porque o linhão que permitiria essa ligação passa por terras indígenas. Resultado: energia mais cara e suja para os cidadãos da região.

Enfim, a falácia do “país rico com povo pobre” se baseia na confusão entre disponibilidade de recursos natuarais e sua exploração econômica. Ou, como diz a especialista, na transformação de vantagens comparativas em vantagens competitivas. No final, a riqueza é gerada pelos homens organizados em sociedade, não pela natureza. São as instituições humanas que nos tornam ricos. E o preço das coisas é a medida da eficiência com que fazemos isso.


Este artigo foi orinalmente publicado no Blog do Marcelo Guterman.

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